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OSG na Flip: autores negros reivindicam lugar da literatura afro-brasileira no evento

Sarau destacou potência da arte inspirada pela ancestralidade afro em evento ainda menos diverso do que o esperado

relogio min de leitura | Escrito por Felipe Galeno | 04 de agosto de 2025 - 13:50
Autores de São Gonçalo, Niterói e de outras regiões do Rio declamaram versos e textos inspirados pela herança afro na cultura literária do país
Autores de São Gonçalo, Niterói e de outras regiões do Rio declamaram versos e textos inspirados pela herança afro na cultura literária do país -

Por mais diversa que seja em sua programação, a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) ainda enfrenta um desafio na valorização da representação de expressões culturais afro-brasileiras. A maioria dos convidados para a programação oficial, que terminou nesse domingo (03), eram autores brancos e a ausência de espectadores negros nas plateias foi sentida por quem participou do festival.

Na mesa “O Brasil sem espelhos”, realizada na última sexta (01) no auditório principal da Flip, os convidados para o painel - a historiadora Ynaê Lopes dos Santos e o jornalista Tiago Rogero - destacaram durante a conversa a falta de espectadores pretos, enquanto conversavam sobre racismo e sociedade diante de uma plateia majoritariamente formada por pessoas branca. “Nada contra as pessoas brancas que estão aqui na plateia, pelo contrário, mas faltam pessoas negras na plateia da Flip”, disse Rogero.


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O episódio reflete um cenário mais amplo da situação envolvendo a literatura negra no Brasil. Apesar de muito mais presente nas livrarias e nos debates populares, os livros e projetos de autores negros ainda enfrentam amplos desafios para deixar a invisibilidade. O tema foi discutido de forma poética no sarau “Escritas Pretas e Originárias”, realizado também na sexta (01) na Casa da Leitura e do Conhecimento e mediado pelo produtor criativo Alberto Rodriges, o Alberto Flisgo, que é de São Gonçalo.

Alberto Flisgo
Alberto Flisgo |  Foto: Fábio Alves

Autores de São Gonçalo, Niterói e de outras regiões do Rio declamaram versos e textos inspirados pela herança afro na cultura literária do país. Uma das presenças ilustres do evento foi a do poeta e ativista Ele Semog, que participa de ações do movimento negro desde os anos 70 e falou sobre seu trabalho. Ao jornal O São Gonçalo, Semog destacou que a presença de representatividade preta em festivais como a Flip ainda é deficitária, mas que a potência da literatura negra não pode ser medida por isso.

Ele Semog
Ele Semog |  Foto: Fábio Alves

“O que é mais importante para a gente não são eventos como a Flip. O que é mais importante pra gente é a competência que a literatura negra teve nos últimos 20 ou 30 anos de se ramificar, se capilarizar pelo Brasil. Hoje, você tem autores negros escrevendo sobre si próprios, sobre suas histórias, suas memórias, suas subjetividades, praticamente em todo o Brasil, né?”, afirmou Ele.

Essa fidelidade às subjetividades afro-brasileiras é uma das armas para encontrar um público leitor, como destacaram outros autores pretos presentes no evento. A professora e escritora Rosana Silva, de Belford Roxo, enfatizou que essa representação da subjetividade é o que tem usado para afirmar seu espaço em um cenário editorial ainda hostil às produções culturais negras.

“As regiões periféricas sempre sofrem um apagamento. É difícil a gente ser reconhecido, se colocar. Eu tenho conseguido um espaço, mas de forma independente. Eu sou escritora independente, mas as pessoas gostam muito das coisas que eu falo porque também se identificam com o que eu falo. Então, eu entendo que representar essas pessoas é uma forma de incluir os lugares e essas pessoas numa sociedade que tenta o tempo todo apagá-las”, destaca Rosana.

Rosana Silva
Rosana Silva |  Foto: Fábio Alves

Semog complementa reforçando a importância de levar essa luta para o centro do debate público democrático. “Na literatura negra - e as artes negras de uma forma geral, o que a gente tem é a construção de um novo cidadão para enfrentar os desafios da democracia. Isso tudo se dá dentro do ambiente democrático. Então, nós precisamos melhorar a democracia brasileira no sentido de igualdade, oportunidade e, se isso não partir da comunidade negra, não vai acontecer porque o branco está num lugar muito confortável dentro do Brasil desde o descobrimento”, afirma o autor.

Iniciativas como sarau realizado na Flip são indicativos de que essa luta está acontecendo e produzindo resultados, como destacou o mediador Alberto Flisgo. “O Brasil é diverso: tem narrativas diversas, construções literárias diversas. Então, quando a gente oportuniza e constrói acesso a bens sociais e a bens culturais para fazedores de cultura nos segmentos de literatura, é muito importante que a gente potencialize a arte e a cultura no estado”, conclui o gonçalense.

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