Entrevista: Novo comandante do 7º BPM fala sobre barricadas e letalidade policial em São Gonçalo
Em conversa exclusiva, Cel. Lourival repercutiu investigações de corrupção no Batalhão e operação em comunidades; “estamos avaliando o local, mas vamos operar no Salgueiro”

O coronel Lourival do Nascimento Junior, que assumiu o comando do 7º Batalhão de Polícia Militar (BPM), em São Gonçalo, no último dia 29 de agosto, recebeu O São Gonçalo para uma conversa exclusiva sobre a cidade. Recém-chegado do 41º BPM (Irajá), o policial falou sobre os desafios do combate ao crime organizado na cidade, comentou as denúncias de corrupção policial investigada pela Corregedoria em São Gonçalo e prometeu remover barricadas e ampliar “a sensação de segurança” do morador. Confira a conversa completa:
OSG: Obrigado por receber nossa equipe, comandante! Para começar, queríamos relembrar um pouco da sua trajetória. O senhor tem mais de 30 anos na corporação e já esteve à frente de diferentes batalhões no Rio. Como decidiu se tornar policial e o que te move a seguir nesse ofício?
Cel. Lourival: Há 31 anos atrás, eu fazia concursos para determinados locais e a academia militar proporcionava estudo e salário, né? Então, uma das opções que eu tive na época era ir para a academia militar. Com isso, acabei indo em direção à Polícia Militar em 1994. Em março de 2006, eu faço 32 anos de polícia.
O 7º BPM é o meu sexto comando. Comandei duas unidades do interior, que foram Três Rios e Santo Antônio de Pádua. Depois, eu comandei o 16º BPM, em Olaria, o 18º [BPM] em Jacarepaguá, depois o 41º [BPM], em Irajá, e agora me deram a designação de comandar o 7º BPM. Nunca tinha vindo a São Gonçalo, mas a gente vai se familiarizar com tudo e vamos tentar ajudar a população.
OSG: A ideia da nossa conversa é falar sobre as principais questões da cidade. Para começar, não temos como não falar das barricadas. Só nos sete primeiros meses do ano, a PM removeu cerca de 1,8 mil toneladas de barricadas em São Gonçalo. Mesmo assim, são frequentes os relatos de barricadas reinstaladas poucos dias após a remoção e moradores de diferentes bairros relatam enfrentar, diariamente, impedimentos no ir e vir em diferentes bairro. À frente do 7° BPM, como o senhor pretende lidar com esse problema e impedir que as operações de remoção de barricadas sejam ineficientes em comunidades com forte presença do tráfico?
Cel. Lourival: Na verdade, a gente continua com as operações de retirar os barricadas. Estamos vendo a viabilidade de conseguir mais caminhões e máquinas para que a gente consiga ter um alcance maior de retirada de barricadas. Estamos nos aliando com a delegacia de São Gonçalo para que a gente consiga identificar e prender as pessoas que colocam barricadas - que, todas as vezes, estão a mando do tráfico. Essas pessoas precisam ser presas também.
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Paralelamente a isso, a gente vai fazer operações como a gente já vem fazendo desde o início do comando. Todo dia, a gente opera em alguma comunidade a fim de reprimir o tráfico de drogas e, consequentemente, impedir também que eles continuem colocando as barricadas. A barricada traz um prejuízo muito grande para o morador, que acaba ficando refém, isolado. Eu tenho relatos de pessoas [cujos] parentes e amigos já não vão mais à casa porque passam por várias barricadas.
A nossa ideia e o cenário ideal é acabar com as barricadas. Mas, em um primeiro momento, [vamos] empurrar essas barricadas bem para dentro das comunidades, onde a gente consiga dar uma maior mobilidade para a população.
OSG: O senhor tem experiência em áreas dominadas por diferentes tipos de crime organizado, de milícia e grupos de tráfico de drogas distintos em conflito. Em São Gonçalo, boa parte do território costuma ser dominado por uma mesma facção criminosa: o Comando Vermelho. Como pretende combater a atuação da facção no território levando em conta esse "fortalecimento" que eles têm no município?
Cel. Lourival: Na verdade, eu não vejo esse fortalecimento todo. A Polícia Militar representa o Estado e nós vamos fazer com que a lei seja cumprida. A única coisa que eu vejo com isso é que a população acaba não sofrendo com disputas territoriais em relação a facções rivais, já que aqui é dominado, em todas as comunidades, pelo Comando Vermelho.
De resto, nossa ação é a mesma, independente da facção. E a população tem que entender o seguinte: qual é o objetivo de um cara que se propõe a portar um fuzil? A Polícia Militar vai atuar e prender qualquer traficante ou elemento portando qualquer tipo de arma ou droga.

OSG: Nos últimos anos, São Gonçalo foi cenário de algumas das operações mais letais do país, como a do Salgueiro em 2023, e também de alguns episódios polêmicos de mortes de civis durante operações, como o caso de João Pedro ou o de Juan Rodrigues. Como pretende evitar que mais casos desse tipo, frequente no município, não aconteçam? Diminuir os números de letalidade nas operações é uma preocupação para o comando do 7° BPM?
Cel. Lourival: A gente adota todos os protocolos da ADPF [Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 635] - que são protocolos que, de alguma forma, tentam impedir que pessoas inocentes sejam alvejadas. Eu costumo orientar toda semana ao GAT e PATAMO, que faz o policiamento, e, uma coisa que eu costumo dizer, é que ninguém criou seu filho para matar. O policial também não foi formado para matar. Ele não sai de casa para vir trabalhar e ter que matar alguém. Não existe esse clima dentro da corporação.
Ninguém é incentivado a isso. Pelo contrário, a ideia que a gente tem é de prender. E a gente pede até que não confronte com a polícia, que não dê tiro na polícia. Porque a polícia não está ali para matar ou tirar a vida de ninguém. A polícia está ali para prender, que é um anseio da sociedade. A sociedade se sente também, de alguma forma, ameaçada. O morador de bem que passa e vê um elemento com um fuzil na mão; isso é uma forma de agressão ao cidadão de bem.
Então, o intuito principal do 7° BPM e da minha gestão é prender os elementos que estiverem fora da lei. Posso dar um exemplo do meu último batalhão, o 41º, que fica numa área de rivalidade histórica entre facções, comunidades com poderio bélico muito grande. E lá, em um ano e 45 dias, foram apreendidos 138 fuzis e com 65 letalidades em confronto. Foram mais de 550 prisões. Acho que isso mostra que nossa linha de ação não é ficar matando ninguém.
OSG: Aproveitando o tema das operações: na última terça (17), a PM realizou uma ação em Itaúna, nas proximidades da comunidade do Salgueiro, que terminou com um morto, um preso e uma mulher ferida. Como o senhor avalia a ação? O Salgueiro é considerado um dos pontos críticos da atividade criminosa em São Gonçalo; quais são os planos para combater o domínio do tráfico na região sem colocar moradores em risco?
Cel. Lourival: O primeiro contato que tive com o Salgueiro realmente foi na quarta-feira . Nosso serviço reservado teve informações sobre elementos que se prepararam para realizar roubo de carga ou de veículo.O negócio aconteceu ali na estrada de Itaúna, que é bem próxima da BR [101]. É um local onde qualquer um deveria estar patrulhando normalmente.
Ali, houve esse confronto onde foram apreendidos dois fuzis. Um elemento [foi] preso, um veio a óbito e, realmente, tiveram duas pessoas que tomaram estilhaços. Os mesmos fugiram do hospital. Em um primeiro momento foram no hospital, mas meteram o pé, foram embora sem autorização.
As operações são planejadas e estudadas, a gente sempre procura trabalhar com o apoio do 4° CPA, em alguns casos específicos a gente pede apoio também do Estado maior. Como a gente ainda está começando aqui, estamos avaliando o local, mas vamos operar no Salgueiro. E a Polícia Militar vai apoiar o 7º BPM, através do 4° CPA e através do Estado maior, com os recursos que a gente precisar para operar no Salgueiro.
OSG: No início do ano, a Corregedoria da PM investigou denúncias envolvendo uma quadrilha que supostamente contava com o apoio de policiais militares, com acusados do 7° BPM, para roubar bocas de fumo e receber propina de criminosos em São Gonçalo e Itaboraí. Como o senhor avalia o impacto dessas denúncias na unidade? Que medidas pretende tomar para impedir que esse tipo de corrupção aconteça?
Cel. Lourival: Na verdade, aproveito até a oportunidade para pedir à sociedade que colabore com a Polícia Militar - tanto para denunciar marginais, como também denunciar policiais que não estão de acordo com o regramento da Polícia Militar.
Enquanto eu estiver aqui, se eu tomar conhecimento de irregularidades por parte de policiais militares, será apurado rigorosamente. Caso sejam coisas que eu entendo como mais graves, serão encaminhados diretamente para a Corregedoria, até para que o comando fique parcial diante da situação.
Em relação a essas atitudes de assaltarem bocas de fumo, quando cheguei aqui eu ouvi falarem sobre isso. Mas a gente está com os olhos abertos, prestando atenção, e, com certeza, se acontecer e a gente identificar, os [agentes envolvidos] serão presos e serão encaminhados à Justiça.

OSG: A Polícia em São Gonçalo tem realizado diversas ações pontuais em parceria com o município. Como pretende articular esse diálogo entre o 7° BPM e instâncias de poder municipal, como a Guarda Municipal ou secretarias da Prefeitura?
Cel. Lourival: A impressão que eu tenho já em relação a ele e ao que ele vem fazendo é que é um prefeito que gosta da população, é um prefeito que gosta da cidade e que está apoiando o 7º BPM. E o Batalhão está apoiando a Prefeitura. Já estamos em conversas para realizar operações conjuntas com a Guarda Municipal e com os órgãos de fiscalização. Com as nossas operações, a gente vai trazer alguns órgãos da prefeitura para que a gente consiga ter um alcance maior de resultado. A gente está andando junto.
OSG: Diante da extensão territorial e da grande densidade populacional da cidade, acredita que o Batalhão conta com o efetivo e as estruturas para lidar com a realidade gonçalense? Pretende dialogar com o Governo do Estado para reforçar esse apoio?
Cel. Lourival: Na verdade, eu não preciso acionar, porque o governo do estado já vem realizando vários concursos para fazer a reposição do efetivo - não só do 7º Batalhão, como de todo o Rio. Aguardamos essas turmas se formarem e, com certeza, vai haver uma distribuição de efetivo para todos os batalhões. A gente percebe que o Governo do Estado, juntamente com o nosso secretário, tem esse propósito de reestruturar em termos de efetivo os batalhões.
OSG: No dia da troca de comando, o senhor falou sobre a importância de aumentar a sensação de segurança do morador de São Gonçalo. Quais são suas perspectivas para melhorar esse diálogo entre Batalhão e população local?
Cel. Lourival: O que eu digo para São Gonçalo é que acredite na Polícia Militar, porque a gente vem para cá com o propósito de realmente melhorar a sensação de segurança e trazer condições de segurança melhores para a população. Os indicadores criminais de São Gonçalo estão baixos, mas - e a gente está aqui na sede a menos de um mês, fazendo ainda essa leitura - será que realmente, por mais que os números estejam baixos, a população se sente segura?
Paralelamente a esse diagnóstico, a gente está procurando dar uma maior dinâmica ao policiamento, dando maior visibilidade das viaturas, dos locais de patrulhamento, para que a pessoa possa passar, ver a patrulha e saber que aquele local está policiado, que ele pode se sentir seguro.