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Novos 50? Eles contam o que mudou com a nova percepção da meia-idade

Reportagem traz relatos sobre prós e contras da geração X e como vários fatores, como trabalho, rede de apoio e consciência sobre alimentação e exercícios físicos influenciam na qualidade de vida

relogio min de leitura | Escrito por Felipe Galeno, Lucas Luciano e Sofia Miranda | 11 de maio de 2023 - 10:56
Idade traz nova visão sobre saúde, trabalho e vida
Idade traz nova visão sobre saúde, trabalho e vida -

Os 50 são os novos 40? E os 40 são os novos 30? O quanto essa nova percepção pode afetar a sociedade? É sabido que os valores sociais que exaltam a juventude, a aparência jovem e o bem-estar social e físico contribuem para que o processo de envelhecimento, que deveria ser algo natural, se torne indesejado. Diferente da população da terceira idade, com comportamentos e hábitos já conhecidos e estudados, os “meia-idade” ainda estão caminhando para entender o seu lugar no mundo.

Nesta reportagem, Walace, Simone e Divania relatam suas experiências ao se aproximarem dos 50 anos e todas as descobertas, novidades e adaptações necessárias que vêm nesta nova fase de suas vidas.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a meia idade se refere às pessoas com faixa etária entre 45 a 59 anos. O termo nomeia a fase em que os indivíduos beiram a maturidade e a velhice. Neste período, fatores como auto aceitação, relacionamentos de qualidade, autonomia para tomar decisões são aconselhados e vivenciados para que o processo de envelhecimento, visto na sociedade de maneira pessimista, ocorra de forma mais natural. 

Fatores determinantes para envelhecer bem

O ingresso de parte da população meia idade neste período, no entanto, pode ser associado a fatores que vão além da saúde mental. Condições socioeconômicas e físicas são determinantes na percepção de quem está se aproximando dos 50 anos. Principalmente para aqueles que integram os cenários de baixa escolaridade e de vulnerabilidade social. Para esses, as preocupações financeiras se sobrepõem a necessidade física e estética.

É o caso do motorista escolar, Walace Silva, de 49 anos. Para ele, a exaustão do trabalho, e a necessidade da atividade financeira o impossibilitam de cuidar mais da saúde. “Como eu dirijo o dia todo e fico muito tempo sentado, acabo sentindo muitas dores na coluna. Então eu chego em casa e só quero descansar. Por não estar praticando exercícios físicos, essa é uma área da saúde que complica, porque não tenho mais tanto vigor físico. Mas não consigo, porque se eu trabalhar menos não tenho sustento para dentro de casa”, conta. 

Aos 49, Wallace Silva conta que esforços do trabalho têm começado a pesar
Aos 49, Wallace Silva conta que esforços do trabalho têm começado a pesar |  Foto: Divulgação
  

Segundo a geriatra e professora emérita da Universidade Federal Fluminense (UFF), Vilma Duarte Câmara, condições educacionais e socioeconômicas devem ser pontuadas quando se reforça o discurso de que é preciso adotar um melhor estilo de vida. 

“Hoje as pessoas chegam facilmente até os 80 anos, há uma necessidade de querer viver. Mesmo os indivíduos que têm baixa escolaridade e condição socioeconômica inferior. Dentro das próprias comunidades hoje em dia, têm muitas ONGs, pessoas que trabalham de uma maneira voluntária tentando melhorar o estilo de vida mesmo dessas pessoas que têm difícil acesso à saúde. A Organização Mundial de Saúde prega um envelhecimento ativo, e isso não significa que ele seja forte, trabalhando. É que esse idoso tenha participação. Nós temos que estimular muito para que ele entenda que é um cidadão e como tal, tem direitos e deveres”, explica a profissional. 

"Sete entre 10 brasileiros com mais de 50 anos apresentam alguma doença crônica"
 

A chegada dos meia idade nesse estágio, no geral, também costuma trazer o diagnóstico de doenças não percebidas antes, como a hipertensão arterial, dores na coluna e colesterol alto - as mais recorrentes entre a faixa etária, segundo um estudo de 2018 feito pela Fundação Oswaldo Cruz. De acordo com o estudo, 7 entre 10 brasileiros com mais de 50 anos apresentam alguma doença crônica. Além das patologias, a aparência física também começa a apresentar mudanças, como o aparecimento de rugas de expressão e os temidos fios brancos.

A idade no mercado de trabalho

No mercado de trabalho, a mudança também é notável. Enquanto em alguns lugares os anos a mais de experiência são bem-vindos, em outros, é sinônimo de improdutividade. Para a professora do ensino fundamental Simone Souza, de 50 anos, essa é uma das diferenças mais emblemáticas da fase.

“Dependendo da função, você tem um pouco mais de dificuldade. Algumas profissões querem contratar uma mulher de 50 anos, porque é mais experiente. Para outras, eu com 50 anos não sou uma boa escolha, porque não tenho o vigor para trabalhar de uma menina de 25. Eu, se não fosse professora, não sei se hoje me encaixaria no mercado de trabalho”, acredita a professora, que é solteira e mãe de duas adultas.  

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Para ela, ter um lugar no mercado de trabalho é importante também para a manutenção da saúde mental. “Eu acho que se faz necessário trabalhar sim, com 50, com 60, às vezes até com 70. Quanto mais você movimenta e ocupa sua mente, melhor”, afirma. Ao mesmo tempo, não nega que o outro extremo - o do excesso de trabalho - também acaba atrapalhando bastante, por mais que acabe sendo inevitável em alguns casos por razões financeiras.

Apesar de ter chegado feliz à idade, Simone Souza não nega que meia-idade tem suas questões
Apesar de ter chegado feliz à idade, Simone Souza não nega que meia-idade tem suas questões |  Foto: Divulgação
  

“Eu trabalho em duas escolas, mas não tenho mais tanta disposição. Só que, infelizmente, eu preciso trabalhar em dois lugares porque o salário é baixo. Eu me sinto cansada e, se tivesse condições, trabalharia só em um turno”, explica. Como no caso de Walace, o que a impede de investir mais tempo na atividade física para “ficar uma cinquentona enxutona”, como pretende, é justamente o tempo gasto com as ocupações profissionais. “Eu estou mais no sedentarismo. Não porque quero, mas por conta do trabalho. Por conta de trabalhar muito, chego em casa cansada e não tenho esse ânimo de estar fazendo atividade física”, confessa Simone.

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O lado ruim é que esse cansaço do dia a dia pode acabar distraindo os “cinquentões” de problemas que já vinham se desenvolvendo, como explica o professor de educação física, Fábio Devillart, especialista em psicomotricidade. “Nessa idade, as pessoas começam a ter alguns diagnósticos de pressão alta, diabetes, glicose bem elevada, colesterol alto, tudo por causa de sedentarismo. Essas pessoas costumam ter um baque, porque vem vivendo bem, mas aí faz um exame mais complexo e vê que está com várias taxas altas e correndo até risco”, conta.

Prevenir é sempre melhor do que remediar

Por mais que hoje já não trabalhe mais tanto com pessoas dessa média de idade, experiência do educador físico com alunos mais velhos aponta que, quanto mais cedo se toma consciência da urgência da atividade física, melhor se passa da meia para a terceira idade: “A pessoa que começa a cuidar da saúde desde cedo vai envelhecer com mais tranquilidade. Chegando aí na faixa dos 40 aos 50, a pessoa, tendo a consciência de que ela precisa mexer o corpo e ser mais ativa, vai conseguir chegar na terceira idade com mais firmeza. Vai ser um idoso que vai ter mais autonomia, vai depender menos dos filhos ou de cuidadores no futuro. Vão ter mais mobilidade e a cabeça também vai estar melhor, a parte cognitiva vai estar mais ativa para fazer cálculos, ler, escrever”, explica.

A dona de casa Divania Gomes conta que já sente esse peso das escolhas do passado hoje, mesmo aos 52 anos. “Antigamente só queria comer, comer e não me preocupava com isso. Os jovens não pensam sobre isso, sabe? Pensam em comer e saborear tudo, né, experimentar tudo. Mas, hoje, a gente com essa idade já tem aquela preocupação: ‘O que eu vou comer, será que vai fazer mal à minha pressão alta?”, compartilha.

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Reconhecer isso a ajudou a dar o pontapé inicial para iniciar o exercício físico, que hoje faz regularmente. Além disso, estar próxima de outras pessoas interessadas em cuidar da saúde também deu ‘uma forcinha’ na hora de encarar as atividades. “Quando você está perto de gente que têm o mesmo foco, você fica assim; ‘poxa eu também queria isso’. Eu tinha um pouco de dificuldade, tinha uma preguiça, mas agora juntos, né? A gente lá junto com as meninas, dando um incentivo uns aos outros, tem sido muito bacana, sabe?’”.

Para ela, essa força nas interações também tem a ver com um certo ‘desprendimento’ que a idade traz. Hoje viúva, ela explica que as mudanças que a fase trouxe - inclusive, em sua vida familiar, com o crescimento dos três filhos e a viuvez - a fizeram repensar a sua preocupação com o que os outros pensam de si.

Divania Gomes, explica que chegada aos 50 trouxe consciência sobre a prática de atividades físicas
Divania Gomes, explica que chegada aos 50 trouxe consciência sobre a prática de atividades físicas |  Foto: Lucas Luciano
  

“Procuro ter um foco que é a minha família e, nesse momento, eu tô pensando mais na minha saúde. Nessa idade, a gente começa a pensar: ‘o que que eu vou deixar pros meus filhos?'. Antigamente eu me importava muito, sabe, com as pessoas que não falavam comigo. E agora, assim, não é que não me importe, mas eu penso: ‘se você gosta de gosta de mim, você vai estar falando comigo, vai estar sempre perto de mim, ou vai estar sempre, mesmo longe, me dando um ‘oi’, né? Então eu me preocupava muito com isso e comecei dando importância às pessoas que realmente querem ficar perto”, explica.

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Enquanto Divania passou por uma mudança em suas próprias expectativas para com o resto do mundo, Simone complementa que as expectativas e preconceitos dos outros ainda podem ter um efeito bem negativo em outros tipos de relacionamento. “É uma idade que atrapalha em algumas outras coisas. Arrumar relacionamento, por exemplo, é um pouco mais difícil. Para quem não tem um casamento, é solteiro, fica tudo mais difícil. As pessoas olham para você e falam: ‘está coroa já’”, desabafa.

Tudo deve ser levado em consideração: da genética à escolaridade

A médica Vilma Duarte conta, ainda, que o componente genético também vai influenciar no processo de envelhecimento de cada pessoa. Segundo a profissional, o ser humano possui “uma história patológica” que determina, muitas vezes, como vai ser o seu estado de saúde na meia idade. "Qual é a genética que ele traz? Qual é a história da família? Que doenças são comuns no círculo familiar? Tudo isso vai influenciar lá na frente”, enfatiza ela. 

Mas apesar do fator genético ter impacto, Vilma explica que o que mais conta, no final, é a maneira que o indivíduo conduz a juventude e início da vida adulta. Hábitos como: boa alimentação, evitar uso de bebidas alcoólicas e não consumir drogas, podem diminuir o efeito do histórico familiar. Até mesmo a escolaridade, de acordo com a geriatra, tem implicação na saúde. 

“A educação é muito importante, porque a baixa escolaridade não permite o indivíduo progredir, né? E ele fica sem capacidade de compreender as coisas, fica meio complicado. Com escolaridade, eu digo: o que ele recebeu, qual foi sua qualidade de vida, que ambiente ele experimentou. Isso vai depender da história de cada um”, afirma. 

Para a profissional da saúde, as pessoas são resultado do que escolhem armazenar ao longo da vida. Seja por estímulos externos ou internos. Ela afirma que, embora a meia idade carregue consigo diversas preocupações e estigmas, a diferença, contudo, será na forma que cada um escolheu viver a partir das condições que lhe foram impostas. 

Sabedoria para viver e transmitir

Mesmo ainda longe da fase final de envelhecimento, outra coisa que a meia idade traz é, na opinião dos  entrevistados, uma visão a mais de sabedoria a ser passada para as gerações mais jovens. Divania, por exemplo, conclui, a partir de sua experiência, que o mais importante na juventude é aprender a tomar decisões com responsabilidade. 

“Eu diria para os jovens pensarem mais na família e na saúde antes de escolherem qualquer coisa. Porque nessa de tomar decisões precipitadas, às vezes as consequências não são tão agradáveis. Os jovens de hoje não pensam muito sobre isso. Cuide da sua saúde, cuide dos seus pais e da sua família de forma geral. Lembre-se que um dia você vai ter essa idade e vai precisar de apoio também”, compartilha. 

"A vida é curta [...] Viva com intensidade porque lá na frente, o vigor faz falta".
 

Já Simone pensa que, na mesma medida em que os mais velhos devem acompanhar as tendências do mundo atual para se manter atualizado, os mais novos também podem adquirir visões proveitosas se escutarem experiências mais distantes das deles. “Até algumas palavras de hoje que os mais jovens costumam usar e eu não sei, pergunto a minha filha o que significa. Mas, ao mesmo tempo, eu também tenho algumas experiências que o pessoal de hoje, mais tecnológico, não entende”, ela contrapõe. 

Por sua vez, Walace enfatiza os estudos como fonte de realização pessoal. “O conselho que eu dou é que estude, busque formação em alguma área. Eu sei que a vontade é curtir, badalar, e tem que curtir mesmo. Mas tudo tem seu tempo e passa rápido. Quando você menos espera a idade já chegou, já está com família e cadê o seu futuro? Hoje você pensa: ‘Ah, estou muito jovem para pensar nisso’, mas não fique nessa não. A vida é curta. Faça faculdade, tenha experiências diferentes, case. Seja lá o que fizer, viva com intensidade porque esse vigor faz falta lá na frente”, conclui. 

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