Arte no currículo escolar: Influência no desempenho estudantil e poderosa ferramenta de inclusão e valorização da diversidade
Envolver os estudantes na prática dessas manifestações artísticas pode trazer inúmeros benefícios que contribuirão com a formação do indivíduo

Através de registros e vivências, percebemos que a arte está relacionada a cultura dos mais variados povos existentes. Ela atravessa os tempos, criando e contando o passado e recriando o presente, compondo assim a história de uma sociedade.
Dessa forma, tem ainda a capacidade de modificar e configurar, através de seus meios, o exterior e interior do homem, por estar ligada a produção de saberes que envolvem os fenômenos artísticos e de práticas que envolvem o ler, o produzir, o refletir, o criar e o construir.
Segundo especialistas, a arte é um campo do conhecimento multidisciplinar necessário para o potencial crítico, expressivo e o autoconhecimento do educando, valorizando a cultura como princípio da criatividade.
E é na escola que as crianças têm a oportunidade de conhecer, apreciar, criticar, dialogar, refletir e valorizar diversas culturas e manifestações da arte, vivenciando as diferenças e valorizando a diversidade.

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Diversas pesquisas comprovam que crianças que são expostas a manifestações artísticas como dança, música e teatro demonstram melhor domínio da leitura, escrita e matemática.
De acordo com Suzane Veiga, atriz e professora do ensino fundamental no Rio de Janeiro e em São Gonçalo, as artes cênicas em sala de aula exercem um papel fundamental no desenvolvimento do aluno, que se vê diante de novas possibilidades e descobertas do mundo e de si mesmos.
"Já trabalhei com artes cênicas em sala de aula e percebi que através dessa ação de se colocar em cena, realmente o aluno desenvolve uma habilidade/capacidade de, primeiro, se perceber e segundo, perceber o outro. Então a partir disso ele entende o seu papel enquanto parte de um todo, desenvolvendo autonomia, desenvolvendo a sua voz, coloca o seu corpo em movimento, a sua autoconfiança, uma série de habilidades que ele vai desenvolvendo em sala de aula, a partir do contato com as artes cênicas", explicou Suzane.
"Eu tive o caso de um aluno, o Pedro, que era muito indisciplinado, tinha muito problema com o respeito às regras, de entender os combinados, e a partir do momento que ele participou do desenvolvimento das cenas, ele entendeu a sua participação ali naquele contato com os outros, entendeu que era parte de um grupo e desenvolveu essa autonomia, essa liderança da sua própria vontade. Ele passou a me ajudar a escrever os roteiros, organizar os figurinos, os elementos do cenário, e isso se repercutiu, se espelhou também em outras disciplinas em sala de aula. Então realmente as artes cênicas em sala de aula no ensino fundamental tem esse papel elementar, de ajudar o aluno a entender que ele é um ser autônomo, e que a sua participação é fundamental para o funcionamento daquela estrutura, o que faz toda a diferença", completou a professora.

A expressão artística começa a favorecer o aprendizado desde o primeiro momento
No Ensino Fundamental, a Base Nacional Comum Curricular contempla a arte por meio da dança, teatro, música e artes visuais. Essas manifestações vão articular saberes que envolvem a prática de criar, ler, produzir, construir, exteriorizar e refletir por meio de seis dimensões de conhecimento: criação, crítica, experiência sensível, expressão, fruição e reflexão.
Envolver os estudantes na prática dessas manifestações artísticas pode trazer inúmeros benefícios que contribuirão com a formação do indivíduo, além de contemplar, inclusive, o desenvolvimento das habilidades socioemocionais e proporcionar o alto desempenho.
Para Juliana de Souza Mota, 28 anos, formada em licenciatura em teatro, graduanda em licenciatura em história e professora de artes do Colégio de Aplicação Dom Hélder Câmara, em São Gonçalo, ter a arte no currículo escolar traz inúmeros benefícios para o desenvolvimento do aluno, como por exemplo o aprimoramento de sua autonomia.
"Acredito que a arte traz um autoconhecimento através da expressão nas aulas de artes. Nas aulas em que não usamos o livro, que são as minhas preferidas, é o momento em que o aluno pode se expressar com o que ele gosta, e a gente acaba conhecendo a personalidade de cada um, através de um desenho, um poema, um texto. Acho essas aulas importantes também na questão da autonomia, além da prática de conseguir manusear, por exemplo, uma cola, e saber a quantidade necessária para colocar um determinado desenho, ou então a noção motora de cortar, que são coisas que parecem óbvias para nós, adultos, mas que para uma criança, em desenvolvimento, requer prática", afirmou a professora.
"Na arte a gente trabalha muito a criatividade, e quando o aluno sai da escola e se torna um adulto, essa habilidade é colocada em prática no auxílio à resolução de problemas, na autonomia, na independência. E as crianças, em geral, ficam apaixonadas pelas aulas, apaixonadas pela sala de artes, que é uma sala diferente da que estão acostumados no dia a dia, então é um outro ambiente, outro espaço, que ajuda também nesse estímulo para esse tipo de atividade e prática criativa", completou Juliana Mota.

Algumas pesquisas, como a reunião de 62 estudos no relatório Arts Education Partnership [coalizão nacional dos Estados Unidos que tem como objetivo promover o papel essencial das artes dentro da educação básica], já revelaram que as práticas artísticas podem ajudar estudantes a ter mais noções motoras, além de proporcionar a integração com conhecimentos de outras disciplinas, como a matemática, e melhorar a prática da leitura, contribuindo assim para o desenvolvimento cognitivo como um todo.
Segundo Geiza Ronconi, 58 anos, formada em licenciatura em matemática, psicopedagogia, pedagogia, especialista em administração escolar e coordenadora pedagógica do Colégio de Aplicação Dom Hélder Câmara, essa troca entre a disciplina de artes com as outras matérias do currículo escolar possui uma extrema relevância na formação acadêmica do aluno, visto que uma pode ser o pilar da outra, existindo assim um auxílio mútuo que gera excelentes frutos ao maior dos interessados: o aluno.
"As disciplinas artísticas certamente podem melhorar o rendimento do aluno até mesmo em outras disciplinas. Enquanto coordenadora, me irrita quando falam que artes e educação física são submatérias, porque são disciplinas que colocam não só a mente, como o corpo em movimento, o que é extremamente importante. E isso interfere diretamente na aprendizagem de outras matérias, como por exemplo em língua portuguesa, que o aluno precisa saber escrever o texto com início, meio e fim. Em artes, ele vai aprender a construir uma imagem que retrate o início, meio e fim, então desenvolvendo essas habilidades em artes, isso vai se refletir para a outra disciplina e vice versa. A arte salva, seja ela na forma como se estuda na escola, como também na prática da dança, do teatro, da dramaturgia e da música", explicou a coordenadora pedagógica.
"Aqui no Dom Helder, além das atividades curriculares, em que procuramos sempre incorporar as artes de alguma maneira, quando é possível também trazemos outros elementos artísticos para auxiliar nesse ingresso à cultura, como grupos de teatro. Trouxemos em abril um grupo de teatro que estava fazendo um projeto em São Gonçalo, e eles ficaram de retornar agora no segundo semestre com um novo trabalho. A gente faz com que os alunos respirem arte de qualquer forma, para que se sintam livres e inseridos na cultura", completou Geiza Ronconi.

Arte como alicerce do desenvolvimento cognitivo infantil
Desde cedo, as experiências artísticas ajudam as crianças a explorarem o mundo ao seu redor. Elas aprendem sobre cores, formas, proporções e espaço — e tudo isso enquanto se divertem. Mas por trás dessa aparente simplicidade, há um processo cognitivo sofisticado em andamento.
A expressão artística ativa regiões do cérebro ligadas à memória, atenção, planejamento e linguagem. Quando uma criança desenha, por exemplo, ela está organizando ideias, conectando conhecimentos prévios e até mesmo projetando sentimentos. Isso tudo contribui para o fortalecimento das funções executivas, que são fundamentais na aprendizagem escolar e na resolução de problemas. Confira alguns benefícios do ensino de artes:
- Estímulo à Criatividade e Imaginação
- Melhoria na Atenção e Concentração
- Fortalecimento da Memória Visual e Espacial
- Desenvolvimento da Linguagem e Comunicação
- Pensamento Crítico e Resolução de Problemas
O estímulo às artes ainda pode melhorar fatores relacionados à saúde, tais como a concentração, memória, bem-estar e alivia o estresse e ansiedade.
Arte e educação como pontes culturais
A cultura é algo muito abrangente dentro da sociedade. Dentro de uma escola, por exemplo, existe uma diversidade de pessoas com as mais diferentes crenças e tradições, e é através da cultura que os alunos começam a entender o mundo ao qual estão inseridos e assim comecem a exercer o respeito pelo próximo.
Com isso, é fundamental que as instituições de ensino possam incluir projetos voltados ao conhecimento cultural e aprimoramento criativo. Essas atividades podem ser diversas, como visitas guiadas a museus e centros culturais; peças teatrais; shows musicais e muito mais. Para que o aluno use sua imaginação de maneira livre e criativa, basta estar inserido em um meio que o incentive às práticas artísticas e o estimule a expressar não só seus dons, como também seus sentimentos, e para isso, seja colocado em prática, escolas, educadores, pais e responsáveis de maneira geral, tem papel fundamental.
"Foi através de uma professora de literatura, juntamente a uma professora de artes, que eu me tornei professora. Eu não fui uma aluna exemplar, mas no terceiro ano falei para minha professora que "queria mudar o mundo" e ela me disse: "na sala de aula você tem trinta vidas, que se tornam sessenta em suas casas, então você pode começar com essa mudança dentro de uma sala". Foi nesse momento que decidi ser professora de artes. E hoje, poder transferir o meu conhecimento e estar do outro lado, como educadora, é muito importante e me deixa extremamente feliz, porque assim como uma professora me transformou, eu espero também poder fazer isso pelos meus alunos, retribuindo de alguma maneira tudo que recebi", contou a professora Juliana Mota.

A arte, ao promover a inclusão e valorização da diversidade, permite que alunos de diferentes origens e habilidades se expressem e se conectem. Através dela, eles encontram um espaço de acolhimento que facilita a construção de uma comunidade escolar mais colaborativa.
O professor, nesse contexto, assume um papel de mediador e facilitador da aprendizagem, estimulando metodologias ativas e incentivando a autonomia e o pensamento criativo dos estudantes. A arte também se torna uma poderosa ferramenta de inclusão, permitindo que alunos se expressem por meio da música, pintura ou teatro. Além disso, valoriza a diversidade cultural ao explorar manifestações artísticas de diferentes povos, promovendo o respeito e o pertencimento.