Com milhões de views no TikTok, cantor gonçalense DeLuca comenta novos projetos e paixão pela música
Artista de São Gonçalo, que mistura R&B com outros estilos musicais, é o convidado desta semana de 'OSG Encontros'

Um dos principais artistas da cena pop e independente de São Gonçalo é o nosso convidado da semana no OSG Encontros. O cantor DeLuca, que acumula mais de 250 milhões de visualizações no TikTok e milhares de streams nas plataformas de músicas, veio à nossa redação para trocar uma ideia sobre música, arte periférica e sobre seu futuro álbum, “Honestamente Brutal”.
Previsto para ser lançado ainda em 2025, o novo álbum dá continuidade ao projeto iniciado pelo artista no início deste ano, com um curta-metragem homônimo, realizado através do Fundo Municipal de Cultura de São Gonçalo e do incentivo da Lei Paulo Gustavo. Na conversa, DeLuca falou ainda sobre suas composições favoritas e criação de sua identidade artística. Confira a entrevista na íntegra:
OSG: Queria começar perguntando sobre seu nome artístico: você se chama Samuel Lucas, mas escolheu como DeLuca sua identidade artística. Qual a origem desse nome artístico?
DeLuca: Um pouco antes de eu começar a pensar em lançar música, a minha mãe me contou que o meu segundo nome seria DeLuca. Meu nome é composto, Samuel Lucas, e seria Samuel DeLuca, mas meu pai barrou a ideia. Aí, quando comecei a pensar numa carreira artística, eu queria encontrar um novo nome que fosse um pouco familiar, mas que também me distanciasse do Samuel - porque, na minha mente, se um dia eu desistir, eu quero simplesmente esquecer que aconteceu e seguir em frente como Samuel mesmo.
É bom [o nome], porque tem essa dualidade, né? Quando eu tô em casa com a minha mãe, é Samuel, quando eu tô com as pessoas que eu conheci depois da carreira artística é DeLuca. O Samuel me dá essa sensação de familiaridade e o DeLuca é mais essa persona que a gente acaba criando para dar entrevista, para cantar. Não tem nada de alter ego, não. É só como eu sou chamado pelas pessoas que me conhecem desde 2019, que foi quando eu lancei minha primeira música.

OSG: A gente queria conversar justamente sobre esse seu começo. Sei que você canta desde a infância. Quando você descobriu essa paixão pela música?
DeLuca: Eu comecei a cantar no mesmo tempo que eu comecei a falar. Eu venho de uma realidade cristã e a música tá muito ligada à vida de igreja. Uma das minhas primeiras lembranças é da minha mãe ligando para uma emissora de rádio local e colocando o telefone para eu cantar, porque eles davam oportunidade. Me lembro claramente de estar com o telefone, cantando, e de ouvir minha voz no rádio depois, na gravação.
Então, eu comecei a cantar quando era bem criança mesmo. Me lembro que eu era tão fascinado pela ideia de ter um CD, de ter composição que, mesmo sem saber que os artistas compõem músicas, eu já escrevia, fazia composições. Fazia até encarte de CD. Eu era uma criança muito solitária então, no quintal, eu pegava papelão, enfim, fazia encarte, escrevia músicas, uma loucura assim. Minhas primeiras lembranças são musicais na verdade.
Confira outras conversas da série OSG Encontros:
➢ Pagode do Adame fala sobre nova formação, relembra origens em SG e escolhe sucessos favoritos
➢ Júlio São Paio relança disco clássico e fala sobre trajetória de mais de 50 anos na MPB
OSG: E aí foi na adolescência que você começou a cantar publicamente?
DeLuca: É. Ainda na infância, eu cantava na igreja, cantava em casamento, cantava em festinha de criança, enfim. Mas foi na adolescência que eu comecei a querer produzir música também, porque já não estava sendo suficiente cantar músicas de outras pessoas.
Teve um tempo de rebeldia ali na adolescência em que eu achei que música não era para mim, mas a música é uma coisa que, para mim, acontece até quando eu não estou pensando sobre isso - quando estou em momentos ruins, quando estou em momentos bons. Então, não conseguiria me distanciar por muito tempo.
Na adolescência, eu comecei a procurar descobrir como eu poderia produzir música pra mim mesmo; como eu poderia fazer isso de uma forma que as letras tivessem a ver com o que eu vivo, com quem eu sou, de onde eu venho. Foi na adolescência que eu comecei a querer produzir para mim mesmo.
OSG: Entendi. E começou assim, espontaneamente?
DeLuca: Sim, espontaneamente.
OSG: E aí você lançou sua primeira música ali com 19, 20 anos, certo?
DeLuca: Por volta dos 20, por aí.
OSG: Como é que foi o processo para lançar essa primeira canção? Era uma música que você já tinha há muito tempo?
DeLuca: Então, demorou uns dois anos até eu finalizar tudo, porque eu ainda era meio tímido. Ainda sou meio... Não é nem tímido; eu sou um pouco retraído. Mas eu comecei a ter a ideia de lançar música por volta dos 19, 20 anos. Demorei um tempo para tomar coragem - tanto que a minha primeira música de todas saiu com um amigo da faculdade
Foi por 2019 que eu comecei a fazer os meus primeiros lançamentos, eu já estava um pouco mais seguro. E aí depois engatou, até vir a pandemia, mas, depois da pandemia, a gente voltou a produzir. Começaram por aí os meus lançamentos autorais.
OSG: E, depois que começou, não parou mais; ao todo, são mais de 50 músicas autorais, certo?
DeLuca: Como sou eu quem produzo, acaba que eu não tenho muito limite, sabe. A realidade do independente é que você precisa juntar dinheiro para produzir, para fazer um ensaio, para fazer uma mixagem e uma masterização legais... Todos esses processos tomam tempo e dinheiro. Como sou eu que componho e produzo, eu tenho essa facilidade. E aí acabo saindo um pouco dos limites. Mas, enfim, não tem limites para a arte, né?
Eu sou muito feliz fazendo e lançando música, porque sempre que vem uma nova ideia, eu já quero compor, já quero produzir, já quero colocar aí na rua. Ultimamente a gente tem planejado melhor as coisas que lançamos. Para falar com mais pessoas, acaba que a gente precisa ser mais assertivo.
OSG: Entendi. Antes de falar um pouco sobre o seu novo trabalho, eu queria falar um pouquinho sobre um momento que você comentou, da pandemia. Você, como todo mundo, parou, mas não deixou isso desanimar sua carreira. E em 2022, ali naquele fim de pandemia, você teve um momento muito importante que foi a participação na campanha do Mês do Orgulho LGBT do TikTok, certo?
DeLuca: Isso!

OSG: A sua música ficou ali entre as três mais tocadas na plataforma por algumas semanas. Como é que foi isso? Como você chegou nessa campanha?
DeLuca: Foi bizarro. Até hoje, eu acho que essa é uma das músicas que eu lancei que mais ressoa: a [música] “Ali.Ás”. As pessoas ainda falam muito sobre essa música. Não é uma das minhas preferidas, mas eu entendo. Tanto que ela viralizou. É estranho viralizar. Na verdade, é menos glamuroso do que parece.
Mas a gente acabou alcançando muitas pessoas com isso. Tivemos essa oportunidade legal. O TikTok, por conta do viral, chamou a gente para usar a música em um filtro deles. Então, a música acabou ficando entre as três mais ouvidas dentro da plataforma. A gente teve bastante frutos com essa música. Foi um período bem legal, porque foi quando eu percebi que eu não fazia mais música só para mim. Eu ainda tinha aquela noção, principalmente por conta da pandemia, de que tinha sempre a mesma galera.
Foi divertido ver a música chegando em outros lugares, em outros países. Chegou em Portugal, enfim… Foi estranho, mas legal. A partir daquele momento, eu fiquei cada vez mais orgulhoso de escrever música e da possibilidade de alcançar novas pessoas.
OSG: Foi uma música que não foi muito planejada, então, para se tornar viral?
DeLuca: Definitivamente não. Eu estou sempre falando de sofrimento romântico, por algum motivo. Essa música acabou chamando a atenção e eu acho que tem a ver com isso. As pessoas gostam de ouvir música com que elas consigam se relacionar. Eu sou uma pessoa bem relacionável.
Não tem nada muito glamuroso no nosso trabalho, mas é um trabalho que é feito de verdade, com muito carinho e dedicação. Essa música, provavelmente, viralizou por esse combo. Eu fazia uns vídeos ali [na plataforma] e devo ter chamado a atenção, enfim. E aí o TikTok acabou chamando a gente e eu me sinto muito orgulhoso por esse projeto.
OSG: Que bacana. Você falou que fazia os vídeos. O audiovisual está muito presente em toda essa sua trajetória e, mais recentemente, você lançou um curta-metragem, que tem o mesmo título do seu futuro novo álbum: “Honestamente Brutal”. Queria que você falasse um pouquinho sobre isso: você já tinha uma ideia de fazer um curta para acompanhar o novo trabalho?
DeLuca: O curta-metragem veio de uma necessidade de mostrar essa cultura de favela. Eu venho da favela. É muito difícil crescer lá; as pessoas ainda têm essa mentalidade de que o favelado não sabe fazer coisa de qualidade, só sabe fazer um tipo de música, só sabe ter um tipo de mentalidade, enfim. E aí esse curta-metragem veio dessa necessidade de mostrar de onde eu venho de uma forma bem crua.
A gente conseguiu através da Lei Paulo Gustavo, pela prefeitura de São Gonçalo, e usou o fundo para fazer um vídeo de celular que tenha a ver com o universo do "Honestamente Brutal", que é o meu álbum - que sai no final do ano e ainda está sendo mixado. [O curta] foi produzido todo com o celular em uma coisa bem…
OSG: De guerrilha.
DeLuca: Bem de guerrilha, totalmente de guerrilha! E é um curta-metragem que fala da minha origem. Tem cenas mostrando o bairro onde eu cresci, o Mutuapira. O roteiro, que foi feito por mim, fala muito sobre resiliência, sobre crescer, sobre aprender, sobre se criar nesse local que é muito esquecido. É um local que é muito preterido, é um local de difícil acesso e é um local que é difícil de você sair. Eu sou um artista que consegui, através da música, conhecer pessoas que me ajudam a crescer, mas não é todo mundo que tem essa oportunidade.

Esse curta-metragem veio justamente para alcançar pessoas que, às vezes, não têm esse estímulo, porque às vezes aquela realidade é tudo que elas conhecem. Eu queria quebrar esse ciclo. Não cresci tendo dinheiro para fazer curso de música, curso de violão, violino, teclado. Eu não tive como; a gente tinha que escolher entre comer, pagar a luz ou isso. Então, eu sei que eu sou privilegiado por ter conseguido aprender sozinho os instrumentos, a produção e por conseguir lançar essas músicas.
Tem gente que está lá na favela e canta muito bem, melhor do que eu, escreve melhor do que eu, e não tem essa percepção de que pode sair dali. Então, eu sou muito feliz por poder falar sobre isso no curta, poder talvez trazer essa mensagem para uma criança, um adolescente que está saindo do ensino médio ou um adulto que já desistiu de ser cantor, compositor, produtor. O curta "Honestamente Brutal", assim como o álbum, tem essa mesma pegada de falar das origens, falar dos diferentes tipos de música que vêm da favela e que alcançam a cidade, enfim.
Tenho muito orgulho [do curta]; minha mãe está nele, as ruas onde eu cresci e aprendi a cantar estão nele. É um curta de que eu tenho muito orgulho e esse é um projeto do qual eu estou muito orgulhoso e ansioso para que as pessoas ouçam, vejam, consumam e foquem nos detalhes. Tô muito feliz por realizar e idealizar ele.
OSG: Esse álbum já tem uma data de lançamento?
DeLuca: Uma data definida não, mas é no final desse ano. A gente vai lançar com a Liboo e a Virgin Music Brasil. Estou muito empolgado e eu espero que as pessoas gostem.
OSG: Quero aproveitar para falar um pouquinho mais sobre esse álbum, o “Honestamente Brutal”. Assim como toda a sua carreira até agora, é um álbum que mistura um pouco alguns estilos. Sei que tem ali algumas influências também do pagode, do funk, que não são necessariamente os gêneros que você costuma mais fazer direto. Acho legal que sua música passeia por todos esses gêneros, não fica muito estanque em um estilo musical só. Quais são as suas principais influências, nesse sentido? Você tem alguma coisa que costuma escutar mais? E como é que você decidiu fazer essa mistura de estilos e de influências?
DeLuca: Essa mistura é uma coisa que eu gosto muito, justamente porque eu amo música de uma forma universal, sabe? As minhas referências começam na MPB: Marisa Monte, Milton Nascimento, Djavan, Jorge Ben... Tem algumas músicas desse projeto em que eu estou muito tentando emular o que a Gal faz, o que o Jorge faz.
Também tem a galera mais nova: Marina Sena, Gloria Groove.. . E aí tem uma galera lá de fora: Mariah Carey, Whitney Houston, Aretha Franklin. Eu gosto muito de música. Música é uma coisa que eu não consigo nem explicar a minha relação. Eu tô fazendo música até quando eu não tô, sabe? Até quando minha voz tá encolhida, eu tô lá cantarolando. Tava esperando a entrevista começar, nervoso, e já estava cantarolando pra ver se diminuía um pouco a ansiedade. Essa mistura vem disso, desse respeito que eu tenho pela música, pela criação, pelos produtores, pelos compositores, pelos percussionistas, instrumentistas.

Por também estar envolvido na produção, eu queria um projeto que tivesse essa colcha de retalhos, mas que fosse muito coerente, muito coeso - não só comigo, mas com o meu trabalho também. Eu não quero que as pessoas ouçam e fiquem pensando: “Ele atirou para todos os lados”. Eu acho que tem uma coisa que liga todos esses ritmos, que é a minha voz. Eu gosto muito de pensar dessa forma, para não cair nessa de “tenho que fazer uma música totalmente assim”. Gosto da ideia de misturar e me desafiar a fazer isso de uma forma coerente. Eu espero que isso esteja sendo transmitido no som.
OSG: Para a gente ir fechando, eu queria fazer a mesma pergunta que eu fiz para a galera que a gente entrevistou num dos últimos OSG Encontros. Você, mesmo com uma trajetória não tão extensa assim, tem muitas canções. Dessas muitas canções - entre as que ainda vão sair e as que já saíram - tem alguma que você guarda mais perto do coração. Se você tivesse que escolher uma de suas músicas, qual seria?
DeLuca: Uma só é difícil, mas tem algumas aqui que são mais especiais. O álbum "Honestamente Brutal" inteiro vale? (risos)
Das que vão sair ainda, tem duas músicas especiais. Uma chamada “Latinoamericano”, que seria o nome do álbum. E uma outra chamada “Travessa Leopoldina”. E, das que já saíram nessa última leva, eu amo “Mente Que Nem Sente”. Não sei se é porque ela é curtinha, mas, sempre que eu ouço, tenho que ouvir mais uma vez. E não é só porque fui eu que fiz, não. Tem músicas que eu fiz e não ouço de forma alguma, porque ninguém merece. Mas a “Mente Que Nem Sente” é muito gostosa.