Dólar down Euro down
PUBLICIDADE
Search

Acusado de assassinato sai pela porta da frente da delegacia após justiça não ver urgência para decretar a prisão

Horas depois, mandado foi expedido

Escrito por Renata Sena | 03 de março de 2021 - 16:57

Ao que parece, nem mesmo imagens de uma execução são suficientes para o plantão judiciário decretar uma prisão no Rio de Janeiro. Com cerca de 20 passagens pela polícia, Fabrício da Paixão de Oliveira, de 20 anos, conhecido como Japinha ou China, foi preso pela Polícia Militar, no último dia 9, mas acabou solto dois dias depois na audiência de custódia. Neste mesmo dia ele foi detido pela Polícia Civil, mas a justiça não viu urgência em prender um homem que cometeu um assassinato e preferiu não expedir um mandado de prisão contra o criminoso, que saiu pela porta da frente da delegacia. 

O Tribunal de Justiça do Rio justificou afirmando que "a autoridade policial não conseguiu demonstrar a urgência da medida, pois, embora já tivesse conhecimento da suposta autoria há dias, só formulou o pedido de prisão no dia 11. Com isso, deixou escoar o lapso temporal que justificaria a chamada urgência qualificada apta a justificar a apreciação do pedido perante o Plantão Judiciário."

O trabalho dos agentes da Divisão de Homicídios de Niterói, Itaboraí e São Gonçalo, começou no dia sete de março, de 2020, quando  criminosos executaram o segurança Carlos Alberto Barros Vieira, no bairro Boa Vista, em São Gonçalo. 

Com o avançar das investigações, os policiais conseguiram identificar o atirador, que cometeu o crime a luz do dia, sob a vigilância de câmeras de segurança da região.

Your browser doesn't support HTML5 video.

Divulgação
 

Além da roupa usada no momento da execução aparecer em fotos das redes sociais do acusado, a polícia conseguiu capturar detalhes nas imagens, como uma tatuagem na mão do autor e seu rosto, que aparece sob o capacete parcialmente aberto. 

Após o homicídio,  ele seguiu a vida no crime, e no último dia 9 de fevereiro, Fabrício foi preso em flagrante pela PM. Ele estava com uma arma e foi autuado por porte ilegal de arma de fogo. 

Levado para a audiência de custódia, no dia 11, em Benfica, o homem recebeu da justiça o direito de responder em liberdade.

Na saída da audiência, ele foi detido pelos agentes da Divisão de Homicídios, que já o investigavam. Na delegacia nenhuma dúvida restava: ele era o homem flagrado nas imagens do assassinato. 

A equipe foi ao plantão judiciário e pediu a prisão do acusado, e foi aí que o imbróglio começou. Como resposta, a promotora de plantão alegou que faltavam elementos para justificar a prisão. A polícia respondeu com as imagens do assassinato e as provas de que o homem era o autor do crime, porém, nem com a segunda tentativa, obteve sucesso.

"Esta signatária já se manifestou nos autos principais. Em sua manifestação esta signatária aduziu que não havia as imagens que supostamente comprovam a autoria por parte de Fabrício. No entanto, ainda que estas estivessem nos autos, não seria caso de urgência que enseja a competência do Plantão Judiciário eis que já a alguns dias a i.autoridade policial tinha conhecimento da suposta autoria, deixando de formular o pedido de prisão preventiva anteriormente, o que demonstra que deve este ser analisado não pelo juízo plantonista mas sim pelo juízo natural - por falta de requisito de urgência".

A juíza acompanhou a decisão do Ministério Público e ratificou a falta de urgência em decretar a prisão no plantão judiciário. 

Os policiais então, pediram a prisão na Vara Criminal de São Gonçalo, mas, por lei, precisaram liberar o acusado. 

Horas depois de um acusado de homicídio sair pela porta da frente da Divisão de Homicídios, a juíza Juliana Grillo, da 4° Vara Criminal de São Gonçalo, decretou a prisão do autor. 

Agora, a polícia civil "coleciona" imagens do homem, que exibe um imenso currículo criminal, enquanto ele aproveita a liberdade pelas ruas da cidade. 

"Não basta a família sofrer com a perda da dor. Enfrentar o luto e ainda assim ter força para pedir justiça? Agora que justiça é essa? A polícia fez o que pode fazer. Identificou, prendeu. Mas aí a justiça acha que ele não deve ficar preso? Por duas vezes, né? Porque tiraram da rua um homem armado, mas a justiça deve ter achado um crime leve e mandou soltar. Aí mostraram que ele é  assassino e mesmo assim não podem prender? Que país é esse? Como a policia vai garantir para a família que a justiça vai ser feita se eles estão secando gelo? Prendendo para a justiça soltar?", questionou, inconformado, um amigo do segurança morto, que preferiu anonimato.  

Os agentes da Divisão de Homicídios preferiram não comentar o caso, mas em nota, a Polícia Civil informou que "A Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí (DHNSG) informa que o acusado foi indiciado por homicídio qualificado e teve sua prisão temporária decretada pela Justiça. 

A investigação prossegue e diversas diligências continuam sendo realizadas com o intuito de capturar o foragido". 

Quem tiver qualquer informação que ajude a polícia a prender, novamente, o homem, que agora é considerado foragido da justiça, pode encaminhar a denúncia para o Whatsapp da delegacia especializada, através do número (21) 98596-7053. O anonimato é garantido.

Execução 

Fabrício estava na garupa de uma motocicleta quando chega na rua mais movimentada do bairro Boa Vista, em São Gonçalo. Ao avistar o segurança, ele já começa a atirar. 

Assustado, o segurança corre, junto com a população que estava no local. O acusado corre atrás e segue atirando. 

Ao perceber que o segurança ainda estava vivo, Fabrício volta ao local, desce novamente da motocicleta e efetua novos disparos. Ele chega a roubar a arma do segurança que, mesmo ferido, entra em luta corporal com o atirador. 

Os criminosos fogem e a vítima é socorrida para o Pronto Socorro Central de São Gonçalo, onde não resiste aos ferimentos e morre.

Ministério Público

Sobre o caso, o Ministério Público do Rio de Janeiro soltou nota explicando o caso e os motivos para tal decisão.

"A Promotoria com atuação durante o Plantão Judiciário no dia referido, informa que não houve análise sobre necessidade de prisão ou não de Fabrício. Isto porque tanto a manifestação ministerial quanto a decisão proferida pela Exma. juíza em atuação foram no sentido de nem mesmo conhecer o pedido formulado, eis que incompetentes para análise do caso.  A autoridade policial já tinha conhecimento da suposta autoria há alguns dias. No entanto, só formulou o pedido de prisão no dia 11, já tendo se escoado lapso temporal que justificaria a chamada urgência qualificada apta a justificar a apreciação do pedido perante o Plantão Judiciário,  conforme previsto no artigo 1º, alínea “f” da Resolução 71/2009 do CNJ . Isso porque o pedido já poderia ter sido formulado ao juízo natural anteriormente. Por fim, registra-se que o Direito Penal brasileiro contempla o Direito Penal do Fato, e não Direito Penal do Autor, ou seja, ainda que a pessoa possua anotações em sua folha de antecedentes criminais, o que se analisa é se naquele caso específico há comprovação da autoria. No caso citado isso nem mesmo foi analisado pelo fato de juiz e promotor em atuação perante o Plantão Judiciário não terem competência/atribuição para análise do pedido, já que isto violaria os princípios do juiz e promotor natural previstos na Constituição Federal."

Tribunal de Justiça

A justiça do Estado também se pronunciou sobre o caso e seguiu a linha do MP-RJ. Segue posicionamento abaixo.

"Conforme as peças do inquérito, Fabrício da Paixão de Oliveira foi preso em flagrante, no dia 9 de fevereiro, por porte ilegal de arma de fogo. 

Levado à audiência de custódia no dia 11, na Central de Custódia de Benfica, ele foi posto em liberdade, com parecer favorável do Ministério Público, após se constatar através laudo pericial que ele havia sofrido agressões durante a prisão em flagrante. Por causa disso, a prisão foi considerada ilegal pelo juízo. 

Somente depois que o investigado foi colocado em liberdade, é que a autoridade policial formulou pedido de prisão temporária, já no Plantão Judiciário Noturno do dia 11, alegando a participação dele no homicídio de Carlos Alberto Barros Vieira, ocorrido no dia 7 de fevereiro, em São Gonçalo. 

O Plantão Judiciário, conforme a Resolução nº 71, do Conselho Nacional de Justiça, destina-se ao exame das causas urgentes.  

E de acordo com a decisão do juiz de Plantão, a autoridade policial não conseguiu demonstrar a urgência da medida, pois, embora já tivesse conhecimento da suposta autoria há dias, só formulou o pedido de prisão no dia 11. Com isso, deixou escoar o lapso temporal que justificaria a chamada urgência qualificada apta a justificar a apreciação do pedido perante o Plantão Judiciário

O Plantão Judiciário, portanto, era, naquele momento, incompetente para o exame do pedido, devendo o caso ser submetido ao juiz natural da causa, ou seja, a uma das varas criminais de São Gonçalo. 

No requerimento feito ao Plantão Judiciário, a polícia chegou a mencionar que o investigado fora identificado por meio de imagens de câmeras e fotos de sua rede social. Contudo, segundo a decisão, não juntou aos autos, no momento da análise, as imagens mencionadas nem qualquer outro documento que demonstrassem que o autor do crime e Fabrício seriam a mesma pessoa. Além disso, as testemunhas ouvidas em delegacia não o identificaram.

A investigação sobre o homicídio ainda não foi concluída pela polícia. 

Quanto à ordem de prisão preventiva decretada contra Fabrício no dia 12, ela diz respeito a outro caso. Trata-se de uma denúncia por roubo de carro que foi aceita pela 5ª Vara Criminal de São Gonçalo. Não há relação com a investigação de homicídio.", explicou o TJ.

Contudo, O São Gonçalo obteve acesso aos mandados e além do crime de roubo citado pela justiça, há sim um mandado pelo homicídio, expedido no mesmo dia 12 de fevereiro contra o acusado.

Matérias Relacionadas