Dia Internacional de Violência contra as Mulheres: 1 em cada 3 sofre assédio sexual no trabalho no Brasil
Pesquisa com mais de 3 mil mulheres mostra que apenas 10% recorrem aos canais formais e que a violência é maior entre quem tem menos poder e renda

Neste dia 25 de novembro é celebrado o Dia Internacional de Violência contra as Mulheres, e um novo estudo expõe a gravidade de uma das formas mais persistentes de agressão: a violência no ambiente de trabalho. De acordo com a mais recente edição da pesquisa Trabalho Sem Assédio 2025, uma em cada três mulheres (35%) já sofreu assédio sexual no trabalho no Brasil e uma em cada seis (16,7%) pede demissão após o ocorrido.
A pesquisa conduzida pela Think Eva e LinkedIn evidencia que a vulnerabilidade hierárquica e econômica são fatores determinantes na incidência do assédio. De acordo com os dados, mais de 35% das entrevistadas já sofreram assédio sexual no ambiente corporativo, e dentre elas, mais de 65% têm renda de até cinco salários mínimos. Em contrapartida, aquelas com renda acima de R$15 mil representam apenas 10% da amostra de vítimas. A mesma lógica se aplica ao nível hierárquico, com o assédio sendo o mais relatado por profissionais em cargos pleno e sênior (45%) e assistentes (29%). O percentual cai para 14% entre diretoras e executivas, que, embora não imunes, possuem maior poder estrutural para se defender ou denunciar.
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A psicóloga e psicanalista da Afya Contagem, Dra Andréa Chicri Matiassi, comenta que o fato de 1 em cada 6 mulheres pedir demissão após sofrer assédio mostra como essa violência tem efeitos profundos na vida psíquica e profissional. Para quem é forçada a sair, os impactos imediatos incluem choque, sensação de injustiça, queda na autoestima e dúvidas sobre a própria competência. Muitas vivenciam sintomas de ansiedade, depressão ou até traços de estresse pós-traumático. Para quem permanece na empresa, o ambiente vira um espaço de ameaça constante. A convivência com o agressor ou com uma estrutura que não a protege gera hipervigilância, medo, dificuldade de concentração e queda de produtividade. Com o tempo, isso pode evoluir para burnout, ansiedade crônica, depressão e sintomas persistentes de trauma.
“Em ambos os casos, o assédio rompe o vínculo saudável com o trabalho. Aquilo que deveria ser fonte de reconhecimento e sentido se torna cenário de violência e objetificação. Esses impactos não refletem a fragilidade individual, mas os efeitos psicológicos de uma situação real de desigualdade e abuso. A estatística revela perdas que vão além do emprego: abala projetos de vida, confiança e a expectativa de encontrar ambientes de trabalho seguros.”
O cenário se agrava pela cultura do silêncio, já que apenas 10% delas recorreram aos canais de denúncia formais das empresas. O estudo ouviu mais de 3 mil profissionais em todo o país. Para Dra Andréa, esse percentual não tem relação com “falta de coragem” por parte das mulheres, mas com um conjunto de barreiras psicológicas e sociais que sustentam a “cultura do silêncio”.
“O medo de retaliação é central. Muitas temem perder o emprego, serem isoladas ou vistas como “problemáticas”, especialmente quando dependem daquele trabalho. Some-se a isso a vergonha e a culpa, alimentadas por uma cultura que responsabiliza a vítima e faz com que ela duvide da própria percepção. Romper a cultura do silêncio, portanto, não significa apenas estimular denúncias individuais, mas transformar o modo como as relações de poder, os discursos e as instituições se organizam em torno do corpo e da palavra das mulheres”, esclarece a psicóloga da Afya Contagem.
Leis em ambiente de trabalho no Brasil
No Brasil, a Lei 14.457/2022 (Programa Emprega + Mulheres) tornou obrigatória a implementação de canais de denúncia eficazes e treinamentos de prevenção ao assédio em empresas que possuem CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio).
O advogado e professor de Direito da Afya Sete Lagoas, Deilton Ribeiro Brasil, explica que com a Lei 14.457/2022, a CIPA passou a incluir a prevenção ao assédio (CIPA+A), e as empresas passaram a ter deveres específicos ao receber uma denúncia formal.
“Elas devem ter regras internas claras, canais acessíveis e seguros para denúncia, garantir anonimato, registrar o relato, investigar com rapidez e imparcialidade, acompanhar o processo até o fim e aplicar sanções quando o assédio for comprovado. Também precisam proteger a denunciante contra retaliações e promover ações contínuas de formação e conscientização sobre assédio no âmbito da CIPA+A”.
Deilton Ribeiro ainda ressalta que a omissão ocorre quando a empresa deixa de cumprir qualquer uma dessas obrigações: ignorar ou desestimular denúncias, não investigar, não garantir sigilo, não registrar os fatos, permitir contato direto entre vítima e agressor sem medidas preventivas, não aplicar sanções quando o assédio é comprovado, ou não implementar políticas e capacitações obrigatórias. “Nessas situações, além de descumprir a lei, a empresa falha no dever de garantir um ambiente seguro e pode ser responsabilizada administrativa e civilmente”, conclui o professor da Afya Sete Lagoas.