São Gonçalo ‘exporta’ talentos
Músicos nascidos na cidade estão espalhados por várias partes do mundo

Nascido no Mutuapira, o cantor Alex Sancher trabalha e vive com a família há 15 anos em Granada, na Espanha
Foto: DivulgaçãoPor Elena Wesley
Chile, Estados Unidos, Espanha. A muitas milhas de distância, há gonçalenses fazendo história no ramo musical. Se os destinos escolhidos se diferenciam, Thiago Lyra, Diego Daflon e Alex Sancher se assemelham quanto à coragem de deixar amigos, familiares e aspectos culturais para trás, rumo ao desconhecido.
Nascido no Mutuapira e criado na Trindade, Alex Sancher vive há 15 anos com a mulher e os dois filhos na cidade espanhola de Granada, onde atua como artista. Embora o auge tenha sido alcançado nas terras do Velho Mundo, foi em São Gonçalo que ele se descobriu músico.
“Minhas primeiras lembranças como criança têm a ver com a música. Lembro que meus tios me davam moedas para cantar música do Roberto Carlos no Mutuapira. Na Trindade, eu mergulhei mais fundo: cantava em uma igreja batista, participava de uma banda. Eu e uns amigos nos juntamos com uma galera que tinha uma musicalidade mais refinada. Eles nos mostraram coisas mais modernas, um pouco de jazz. Me deram base para o que seria minha forma de ver a música”, relembra.
À medida que amadurecia o envolvimento com o ramo, Alex acrescentava mais experiência ao currículo e descobria a própria brasilidade.
“Conheci o Gibran Helayel e participei do disco ‘Brasil Kumbê canta Castro Alves’, em 1999. Nesta época, trabalhava com o maestro Messias dos Santos, que nos fazia tocar o mesmo acorde por horas. Com ele, investi tempo em jongo, calango, músicas de tradição oral. Foi quando comecei a perceber as raízes brasileiras e dar versão à minha própria negritude”, conta.
Com Messias dos Santos, Alex viajou à Espanha, com o intuito de gravar o novo trabalho do maestro, morto em 2011. Porém a experiência cultural fez com que o gonçalense não voltasse ao Brasil.
“Não havia motivos para deixar o Brasil, mas venceu a vontade de ficar aqui na Espanha, onde tudo era novidade. Fui muito bem acolhido, tive oportunidade de conviver com músicos de todas as partes do mundo, de Porto Rico, de Trinidad & Tobago, França, Alemanha, entre tantos outros, e de conhecer o flamenco, que é difícil pra caramba (risos). Até hoje tento aprender...”, destaca Alex, que toca violão, percussão e piano.
Confessando que, às vezes, bate uma saudade de um bom “arroz com feijão”, Alex enfatiza o desejo de retornar ao Brasil, após três anos sem visitar a família.
“Enfrentei um momento difícil, que foi meu tratamento contra um linfoma, porém estou melhor agora e planejando minha turnê. Não vai ser muito grande, mas tenho que passar em São Gonçalo, rever minhas tias e amigos, que sempre me apoiaram. Minha primeira canção, meu primeiro amor foram em São Gonçalo. Eu gosto muito da minha cidade”, revela sem esconder a emoção.
Regendo nos Estados Unidos
Graduado em Música no Brasil, Diego Daflon trabalhava como assistente do maestro Eduardo Lakschevitz em corais de empresas privadas quando decidiu expandir os conhecimentos a partir de um mestrado em Educação Musical com foco em Regência Coral, nos Estados Unidos, em 2008.
“Meu plano inicial era fazer o mestrado e voltar ao Brasil logo depois, onde eu também dava aula particular de teclado e piano. Eu pensava em trabalhar em alguma universidade brasileira ou como regente coral, mas os planos foram mudando à medida que Deus foi abrindo portas nos Estados Unidos”, conta.
Diego preferiu “segurar a bênção” e, hoje, casado e pai do pequeno Lucas, é regente coral em uma das melhores escolas do Estado da Louisiana, no Sul do país.
Jovem vive emoção de retornar em turnê ao Brasil
“Tem sido enriquecedor voltar e ver como o público daqui tem reagido ao meu trabalho. Com base nisso, vejo um bom futuro para o meu trabalho no Brasil. Fui super bem recebido em São Paulo e recebi propostas promissoras por lá. A volta para o Brasil está garantida!”, prometeu.
Na contramão de Alex Sancher, Thiago Lyra, de 29 anos, fugiu propositalmente da “brasilidade” para produzir um estilo que contemplasse toda a experiência cultural que pretende viver.
“Há colegas que vão fazer carreira no exterior para mostrar mais do mesmo com o espírito de ‘escutem minha música porque ela é brasileira’. O que eu busco é a inovação. Meu espírito apela para ‘escutem minha música porque ela é boa, ela é diferente!’. Minha musicalidade é pensada num contexto global, não como um artista brasileiro dirigindo-se ao mundo e sim como um artista sem bandeiras, nem fronteiras, que quer promover a cultura de integração e não de divisão dos povos. Nasci e cresci no Brasil. Não vejo porque buscar influências que já estão na minha música, as influências que busco são justamente as que não tenho”, explica.
O desejo de ultrapassar fronteiras é verificado nas composições. Além das canções em português e espanhol - ou as que mesclam ambos - Thiago gravou “Te Pua Noa Noa”, pertencente ao folclore taitiano.
“Foi algo totalmente desconexo das minhas vivências. Nunca fui ao Taiti, mas gostei e gravei. O pessoal de lá gostou e tenho pretensões de seguir gravando em outros idiomas. Meu compromisso não é com a música brasileira. É com a boa música, seja de onde ela for”, destaca o jovem artista.