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Perfil na internet expõe estudantes que fraudaram cotas e Universidades se posicionam

Estudante que confessou ter fraudado sistema se diz arrependida

relogio min de leitura | Escrito por Redação | 04 de junho de 2020 - 19:15
A influenciadora Larissa Busch se disse arrependida após fraudar sistema para ingressar por cota de negro na UFRJ
A influenciadora Larissa Busch se disse arrependida após fraudar sistema para ingressar por cota de negro na UFRJ -

Por Ana Carolina Moraes e Thalita Queiroz*

Em um movimento paralelo à discussão de temas sobre o racismo, alguns perfis de estudantes das principais universidades do Rio de Janeiro estão sendo expostos na internet e sendo apontados como fraudadores de cotas para ingressar nas instituições. Desde a noite de quarta (3) para a manhã desta quinta (4), já foram mais de 100 universitários expostos no Twitter "Fraudadores de Cotas #antiracista", que tem mais de 100 mil seguidores e o perfil não pretende parar de publicar casos.

Na hora de expor os considerados fraudadores, o perfil em questão posta o nome do fraudador, o curso no qual ele fraudou a cota para cursar, o ano em que ocorreu a fraude, a instituição, a modalidade da cota que a pessoa se inscreveu, sua posição na lista do vestibular com e sem a cota, o que mostra que alunos ficam em posições elevadas e se classificam com a cota, mas ficam em posições bem abaixo na lista sem as cotas. Além disso, o perfil posta a foto do possível fraudador e informa se ele recebe ou não uma bolsa de auxílio para alunos de baixa renda, que a universidade disponibiliza, muitas vezes, para alunos que têm cota.

Diante dessa situação, membros de diretórios acadêmicos e universidades se pronunciaram sobre o caso. João Neto, coordenador geral do DCE-UFF, disse: “Nós entendemos o sentimento que levou até essa exposição. É péssimo ver como uma política tão importante de acesso a universidade, é burlada por esses alunos de forma irresponsável. Mas o debate que precisa ser feito, é como nós conseguimos aprimorar a lei de autodeclaração, para que esse tipo de coisa não torne a acontecer”.

Além disso, João explicou como funciona o sistema de cotas na Universidade Federal Fluminense. “Até 2016 na UFF, bastava um documento escrito de próprio punho, que o candidato era aprovado se cumprisse os requisitos. A partir de 2016 de forma experimental, e 2017 de forma oficial, a UFF montou uma comissão de aferição. Com participação dos movimentos negros da universidade inclusive”. O coordenador diz que isso fez o número de fraudes diminuírem mas que a maioria entrava com recurso e ganhava o processo na Justiça.

Alunos de comunicação social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) também falaram sobre o assunto. Em nota, eles disseram: "Na noite da quarta-feira, 3 de junho, recebemos a informação da existência de um perfil e da exposição de fraudadores de cota das Universidades Públicas.⁣ Entre esses casos, uma estudante de Jornalismo da Faculdade de Comunicação Social (FCS) ingressante de 2017.2. No ano passado, o nosso Centro Acadêmico da FCS recebeu denúncias sobre esse caso.⁣

Eles reforçam a importância da denúncia. "Desde então nos empenhamos em unir forças com o Coletivo Negro Àyoré, criado no segundo semestre de 2018, lutando para que casos como esses sejam cada vez mais denunciados e julgados de maneira transparente. ⁣Pioneiro no Brasil, o sistema de cotas da UERJ é fundamental para que milhares de pessoas tenham a oportunidade de acessar uma universidade pública, por este motivo endossamos sua importância".

Um dos casos de fraudes expostos foi o da influenciadora digital Larissa Busch que admitiu que fraudou o sistema de cotas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 2014, para cursar Comunicação Social. A jovem Larissa, de 24 anos, utilizou uma das vagas de candidatos autodeclarados pretos, pardos ou indígenas independentemente da renda” das cotas para entrar na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). No entanto, a DJ é branca e, por isso, as pessoas na internet consideraram que Larissa burlou as cotas. 

Na última semana, a jovem se manifestou sobre o tema e disse que se aproveitou do fato de sua bisavó ser negra para utilizar a cota. “Acreditava que ter uma bisavó negra me tornava não branca. Eu estava errada. Eu sou uma mulher branca e tive muitos privilégios por isso”, disse a jovem que disse que essa foi a "pior escolha" de sua vida.

Larissa completou: "Quero pedir perdão também para todas as pessoas negras e minorias que lutaram/lutam para que um sistema como as cotas, que busca justiça social, tenha sido criado. Eu me sinto muito envergonhada, mas estou aqui para assumir o meu erro."

Sobre o caso da influenciadora Larissa Busch, a Universidade Federal do Rio de Janeiro alegou que na época do seu ingresso, a jovem havia apresentado uma autodeclaração que garantia o seu acesso à UFRJ. Em nota, eles também informaram que ela não tem matrícula ativa na instituição desde 2018 e que as denúncias recebidas passaram a ser apuradas a partir de 2019 pela a nova gestão da UFRJ.

A Universidade Federal Fluminense disse em nota que os casos de indeferimento de matrícula não são tratados pela UFF com o termo fraude, mas como “não atendimento ao requisito exigido para ingresso pela modalidade específica”, sendo o candidato considerado apto ou não apto à continuidade do processo seletivo.

“Não houve desdobramento ou sindicância investigativa interna que resultasse em cancelamento de matrícula em etapa posterior aos trabalhos da Comissão no âmbito da comprovação de requisitos para ingresso”, disse em nota. A UFF afirmou também que trabalha, desde a 1ª edição do SiSU de 2017, com comissão de verificação da Autodeclaração Étnico-Racial – Comissão de Heteroidentificação e a composição da Comissão varia a cada semestre de ingresso.

Ainda sobre o caso, a Universidade Estadual do Rio de Janeiro informou, em nota, que "vem combatendo fraudes no sistema de cotas por meio de sua Comissão Permanente de Assistência. "De acordo com as regras vigentes, a Comissão realiza uma apuração prévia que poderá ensejar, se for o caso, a instauração de um processo de sindicância para esclarecer os fatos e verificar a existência de irregularidades".

Em relação às denúncias realizadas pelo Twitter, a Comissão informou que vai se reunir para apuração de eventuais casos de desvios de finalidade, fraude ou falsidade ideológica nas autodeclarações, respeitados a dignidade da pessoa humana, o contraditório e a ampla defesa.  

A Uerj ressaltou também a importância do sistema de cotas como principal política pública de inclusão social no Rio de Janeiro e considera inaceitável que esses mecanismos democratizantes venham a ser ilicitamente burlados por aqueles que não tem direito a eles.

Confira a nota da Uerj na íntegra:

"A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) informa que vem combatendo fraudes no sistema de cotas por meio de sua Comissão Permanente de Assistência, instituída pelo AEDA nº 27/19, em cumprimento à Lei Estadual nº 8.121/18. De acordo com as regras vigentes, a Comissão realiza uma apuração prévia que poderá ensejar, se for o caso, a instauração de um processo de sindicância para esclarecer os fatos e verificar a existência de irregularidades. Também são apurados casos encaminhados para a Ouvidoria Geral da Uerj, canal institucional mais adequado para receber esse tipo de demanda.  Em relação às denúncias realizadas pelo Twitter, a Comissão irá se reunir para apuração de eventuais casos de desvios de finalidade, fraude ou falsidade ideológica nas autodeclarações, respeitados a dignidade da pessoa humana, o contraditório e a ampla defesa.  

Por outro lado, vale esclarecer que é compromisso da gestão da Universidade instituir comissão de heteroavaliação para que, antes do ingresso do estudante na instituição, a autodeclaração seja acompanhada de verificação por parte de comissão integrada por representantes de todos os segmentos universitários e étnicos de nossa comunidade.  Apenas dez dias antes da suspensão das atividades presenciais por causa da pandemia de coronavírus, a Universidade criou a Pró-Reitoria de Políticas e Assistência Estudantis, que tem, entre suas atribuições, a missão de instituir uma comissão de heteroidentificação na Uerj.  No entanto, as articulações com os coletivos e as entidades representativas foram interrompidas pela necessidade de isolamento social, pois consideramos necessário que a proposta, que valerá para os vestibulares futuros, seja construída coletivamente.  De todo modo, fica a garantia de que o próximo vestibular, cujo calendário também está suspenso, já contará com o exame de heteroidentificação, juntamente com a autodeclaração.

Para concorrer à cota para negros, indígenas e oriundos de comunidades quilombolas, é exigida do candidato uma autodeclaração, conforme determinado pela Lei nº 8121, de 27 de setembro de 2018. Em caso de declaração falsa, o estudante estará sujeito às sanções penais, previstas no Decreto-lei nº 2848/1940 (Código Penal, artigos 171 e 299), administrativas (nulidade de matrícula, dentre outras) e civis (reparação ao erário), além das sanções previstas nas normas internas da Uerj. Essas informações são fornecidas ao aluno desde o momento da inscrição no vestibular.

Em cumprimento à Lei Estadual nº 8121/2018, que dispõe sobre o sistema de cotas, fica reservado, para os candidatos comprovadamente carentes, o percentual de 45% (quarenta e cinco por cento) das vagas oferecidas na Uerj, distribuído pelos seguintes grupos de cotas:

a) 20% (vinte por cento) para estudantes negros, indígenas e oriundos de comunidades quilombolas;

b) 20% (vinte por cento) para estudantes oriundos de ensino médio da rede pública de ensino;

c) 5% (cinco por cento) para pessoas com deficiência, nos termos da legislação em vigor, e filhos de policiais civis e militares, de bombeiros militares e de inspetores de segurança e administração penitenciária, mortos ou incapacitados em razão do serviço.

O candidato que se enquadrar em qualquer um dos critérios de cota acima e atender à condição de carência socioeconômica definida como renda per capita (por pessoa da família) mensal bruta igual ou inferior a um salário mínimo e meio nacional pode optar por concorrer por meio do sistema de reserva de vagas.

O Departamento de Seleção Acadêmica da Uerj conta com assistentes sociais e outros profissionais para analisar a extensa lista de documentos comprobatórios de carência, conforme consta no edital do Vestibular Estadual, bem como a documentação específica, pertinente à concorrência para cada tipo de cota.

Por fim, a Uerj ressalta a importância do sistema de cotas como principal política pública de inclusão social em nosso Estado e considera inaceitável que esses mecanismos democratizantes venham a ser ilicitamente burlados por aqueles que não tem direito a eles."

Como denunciar:

Casos em universidades federais: 

http://mpf.mp.br/servicos/sac

Casos em universidades estaduais do Rio:

https://mprj.mp.br/web/guest

*Estagiárias sob supervisão de Cyntia Fonseca

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