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Meio ambiente pede socorro

SG integra ampla pesquisa para mapear mudanças em cidades brasileiras com alto índice de poluição

relogio min de leitura | Escrito por Cyntia Fonseca | 24 de julho de 2017 - 09:30
A pesquisa será elaborada por 20 voluntários do Instituto Ativa Mares Brasil, distribuídos em oito estados que compõem a costa brasileira. A previsão de conclusão do estudo é de um ano
A pesquisa será elaborada por 20 voluntários do Instituto Ativa Mares Brasil, distribuídos em oito estados que compõem a costa brasileira. A previsão de conclusão do estudo é de um ano -

O meio ambiente pede socorro e não dá mais para esperar. Com esse pensamento, cerca de 20 voluntários do Instituto Ativa Mares Brasil, distribuídos em oito estados que compõem a costa brasileira, se preparam para iniciar uma pesquisa inédita sobre os principais impactos ambientais dessas áreas. O objetivo do estudo, com duração de um ano, é mensurar as mudanças negativas em cidades com alto índice populacional - São Gonçalo está entre elas - causadas, principalmente pela poluição atmosférica, marítima e resíduos sólidos. A pesquisa tem a parceria do Movimento Brasileiro dos Pescadores Artesanais (MBPA).

A ideia surgiu após análise de relatórios divulgados este ano, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pela Agência Fapesp, além de outros estudos internacionais.

“Com essas pesquisas, ficamos sabendo de dados importantes, mas nem toda pesquisa apresenta dados completos. Decidimos então focar a nossa pesquisa com coleta das informações baseadas na vivência de moradores e pescadores, algo que ainda não vi ser feito. Todos os colaboradores têm mais de 20 anos de envolvimento com a atividade pesqueira. Ninguém melhor para dizer se houve declínio ou não do que pessoas que trabalham nessa área há duas décadas”, explica Daniel Freire, gestor ambiental e responsável pela pesquisa no Rio de Janeiro.

Um dos responsáveis pelo pontapé para realização da pesquisa, Daniel acredita que o maior dos males é a apatia social e por isso é importante mostrar um relatório com todos os problemas para impactar tanto a população quanto os órgãos governamentais.

“A ideia é que cada região possa ajudar a mensurar essas informações, que elas sejam apresentadas para os governos de cada estado que, por sua vez, possam intervir de forma idônea. E vamos apresentar soluções para os problemas apresentados, com metas e números”, explicou.

Entre os demais colaboradores, estão Albertina Raimunda, do Amazonas; Fabiano Ramos (Bahia); Milton Souza (Espírito Santo); Sérgio Honoratto (Santa Catarina) e José Mesquita, Nilza Vieira e Dona Maria (Rio de Janeiro), além de outros.

Saudade de um passado de riquezas

Aposentado da pesca há três anos, Orivaldo Freire, o Durval, de 65 anos, é uma das testemunhas vivas da mudança para pior da realidade dos pescadores e moradores das praias da Baía de Guanabara.

“Comecei a pescar em 1965, com 13 anos de idade. Na época, na Ilha do Pontal, na Praia da Macaca, a gente saía com quatro panos de rede, cada pano com três metros. Pescávamos de 6h a meio-dia e conseguíamos de 15 a 17 quilos de camarão. Hoje, leva-se 12 panos de rede, o que dá 1,2 mil metros, para arrumar um máximo de 8 a 10 quilos de camarão, o que antes, conseguia-se com quatro panos”, contou.

De peixe, também havia muita variedade. Segundo Durval, havia disputa de barcos - ou caícos. Às vezes, mais de 50 disputavam o pescado.

“Hoje em dia não tem mais canhanha, tainha. Alguns pescavam com covo e tiravam mais de 30 quilos de badejo. Nada disso tem mais. Quando falhava em Duque de Caxias, aqui dava ‘epidemia’ de camarão. Amigos com uma redinha simples, tiravam na beira mais de 40 quilos em um dia. O mês de julho era época de camarão ‘de 25’ (ou camarão jumbo). Hoje não tem mais”, acrescentou.

Mudanças também ocorreram na safra da tainha e da anchova, que vêm do sul durante o inverno. Antes pescadas fartamente, essas espécies hoje não são mais vistas. O mesmo acontece com a cocoroca, que aparecia muito também na beira da praia.

Com a redução das espécies, o faturamento dos trabalhadores consequentemente também diminuiu. Segundo o aposentado, com a venda de 1 quilode camarão, comprava-se 3 quilos de carne. Apesar de ter um bom preço de mercado, a quantidade do camarão pescado e o tempo que se leva para pescar, às vezes não compensa.

“Na época, se colocar na moeda de hoje, eu ganhava mais de R$ 10 mil por mês. Hoje em dia ninguém quer saber mais de pesca. Os rapazes começavam na pesca e só andavam de roupa de marca, tinha uma vida social boa. Era praticamente um salário mínimo por dia”, revelou.

Com o tempo, os pescadores precisaram lidar com a chegada das empresas.

“As fábricas de conservas, quando vieram, mataram muita criação. O camarão desova na beira da praia e depois volta para o fundo. Em Paquetá, tem lugar que se mergulhar, encontra borra do óleo vazado até hoje. Isso acabou com a pescaria. Se as empresas e o governo tivessem responsabilidade ambiental desde aquela época, a pescaria poderia estar no mesmo ritmo de antes. Sinceramente, acho difícil voltar a essa realidade”, lamentou o ex-pescador.

Resíduos no ar, na terra e no mar

Segundo maior modal de passageiros do Brasil, segundo o IBGE, São Gonçalo acaba se tornando parte importante na responsabilidade pelo aumento da acidez do PH na água dos rios do entorno. É que quanto maior a concentração de partículas por milhão (PPM) de enxofre no ar - poluente emitido por veículos e motores de embarcações atracadas - mais acidez no PH da água das chuvas e consequentemente, nos rios e oceanos que recebem essa chuva.

“Toda poluição que vem do Centro do Rio para São Gonçalo se concentra sobre os bairros próximos ao litoral da baía, o que chamamos de bolsão atmosférico. No fim da tarde, toda essa água se precipita sobre a região da baía”, conta Daniel Freire. E então, acontece uma reação em cadeia. A acidez da água interfere diretamente na alimentação e reprodução dos peixes.

Hoje, as espécies se reproduzem em áreas com mais de 14 metros de profundidade, ou seja, mais distantes da costa. No entanto, no período determinado, precisam retornar à beira para a desova. Com a água em más condições, muitas gerações de peixes não chegam nem a nascer.

Para a pesquisa, os voluntários vão levar em conta também a emissão de poluentes de veículos que passam pela Rodovia Niterói-Manilha (BR-101).

Outro principal emissor de poluente que será apontado pelo estudo será a área dos barcos.

“Temos próximo a São Gonçalo, posicionado a favor do vento, a área de fundeio, onde ficam as embarcações que mesmo ancoradas, tem as máquinas auxiliares ligadas o tempo todo. São motores altamente poluentes, como os de caminhão, funcionando dia e noite, às vezes por anos de forma contínua”, explica Dani.

Sobre os resíduos sólidos, mais dados impactantes também serão estudados. De acordo com relatórios da ONU, até 2050 existirá mais lixo sólido do que peixe no mar. Cada cidadão gera, diariamente, em média, 1 quilo de lixo que não é devidamente coletado.

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