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São Gonçalo compra mais de R$ 134 mil em munição para treinamento da guarda municipal

No primeiro momento, apenas 50 guardas municipais serão treinados e liberados para usar arma de fogo

relogio min de leitura | Escrito por Daniel Magalhães | 08 de agosto de 2022 - 08:44
Treinamento dos guardas municipais será feito gradualmente
Treinamento dos guardas municipais será feito gradualmente -

A Prefeitura de São Gonçalo deu início ao processo para armar os guardas municipais da cidade. De acordo com a edição de 6 de julho do Diário Oficial do município, o poder municipal investiu R$ 134.560,40 (cento e trinta e quatro mil, quinhentos e sessenta reais e quarenta centavos) na compra de munições para uso no treinamento de capacitação dos agentes da Guarda Municipal de São Gonçalo, especificamente 50 agentes da Ronda Ostensiva Municipal (ROMU).

Desde 2018, o município vive um imbróglio relacionado ao armamento dos guardas municipais. Um ano após a cidade de Niterói realizar uma consulta pública com a mesma questão e a maioria dos moradores da cidade votar contra a decisão de conceder armas de fogo aos guardas, São Gonçalo seguiu o caminho contrário e, em setembro de 2018, a Câmara de Vereadores aprovou o plano de armamento por 21 votos a 1.

Apesar da vitória esmagadora, o plano não foi colocado em prática. Praticamente três anos e algumas controvérsias depois, ainda não é possível ver guardas com armamento letal pelas ruas de São Gonçalo. Ainda em 2018, guardas que não faziam parte da ROMU não ficaram felizes de saber que ficariam de fora da proposta e disseram que outros problemas, como salários justos, precisavam ser resolvidos primeiro.

Edição de 6 de julho do Diário Oficial mostra a aquisição das munições
Edição de 6 de julho do Diário Oficial mostra a aquisição das munições |  Foto: Reprodução
 

“A nossa realidade é mais cruel do que o governo pinta. Infelizmente. O que o agente da segurança municipal quer é que tenha o plano de cargos e salários justo e não a covardia de armar a guarda sem uma segurança posterior às consequências desse ato.  Se um guarda se ferir, perde metade do salário ou mais. A arma só para uns, irá deixar todo grupamento em alvo e risco”, contou um guarda que preferiu não se identificar na ocasião.

Nas ruas, a população de São Gonçalo concorda em partes com os guardas. Muitos acreditam que ter guardas municipais circulando pelas ruas pode aumentar a sensação de insegurança e a violência.

"Eu não acho que seja uma boa ideia, não vejo o porquê de deixar armas com a guarda", disse o ambulante Antônio Carlos Ribeiro, de 58 anos. "Eu acho que vai aumentar ainda mais a violência porque isso vai acabar incentivando os guardas a se envolverem em situações sem precisar, eu acho que a arma de choque eles usam hoje já está de bom tamanho", completou o ambulante. 

Júnior Lima, que trabalha em uma loja de seguros no Centro da cidade, também acredita que armar os agentes não é uma boa ideia e ele acredita que isso pode resultar em abuso de autoridade por parte de alguns guardas municipais. 

"Antes eu achava que era uma boa ideia, mas depois mudei. Eu acho que isso pode fazer alguns guardas 'se acharem' demais, ainda mais que agora o uniforme deles é um pouco parecido com o da PM, vão ficar achando que são policiais também e fazer as coisas que só policial pode fazer", disse o vendedor.

Já o repositor de mercado Dilson Alves, de 51 anos, é a favor do armamento dos guardas municipais. De acordo com ele, um agente armado poderá fazer mais pela população e também proteger melhor a si mesmo. 

"Em minha opinião é melhor eles terem arma. Por exemplo, alguém está me assaltando em um lugar e você é um guarda municipal, aí você está desarmado e não vai poder fazer nada. Ele precisa da arma pra fazer a segurança do local", disse o repositor. Questionado sobre o possível engrandecimento de alguns guardas após receberem as armas, Dilson afirmou que isso depende da personalidade de cada um. "Isso aí vai de cada um. Ele está ali para cumprir o trabalho dele, não é porque ele está com uma arma na cintura que ele vai ser melhor que eu. Cada um tem seu jeito, uns vão querer aparecer, mas ele tem que lembrar que a arma está ali com ele só para a nossa segurança.", completou.

De acordo com o professor do Instituto de Criminalística e Ciências Policiais da América Latina José Ricardo Bandeira, a medida é importante para que a guarda municipal seja mais atuante e desafogue a Polícia Militar, deixando-a disponível para resolver crimes maiores.

"A Segurança Pública deve estar em constante evolução e antenada com a realidade atual. Já faz muito tempo que as guardas municipais deixaram de ser simples guardas do patrimônio público e de cuidar de estátuas e praças e se faz necessário que as guardas municipais assumam o seu papel como coadjuvantes na segurança pública", iniciou.

"Portanto, nós termos uma guarda municipal armada e logicamente bem treinada, com normas e padrões de atuação, é fundamental até mesmo na repressão e no combate a pequenos crimes, como pequenos furtos, o tráfico de drogas que acontece nas ruas dos grandes centros, onde não oferece uma grande resistência armada à autoridade pública. Portanto, se tivermos uma guarda municipal melhor treinada, armada e pronta para atuar nesses pequenos delitos, nós conseguimos liberar a Polícia Militar para que ela cumpra seu papel de coibir crimes de maior poder ofensivo e letalidade. Logo, é uma medida a ser considerada, tendo em vista que a guarda metropolitana de São Paulo usa armas e exerce esse papel de coadjuvante na segurança pública", concluiu.

Questionada sobre não ter feito o anúncio das compras das munições para o treinamento dos guardas municipais, a Prefeitura de São Gonçalo respondeu que "processo de compra de munições que serão utilizadas para treinamento dos agentes foi divulgado através do Diário Oficial do município."

Ainda de acordo com a prefeitura, os 50 agentes selecionados vão receber instruções sobre as atividades armadas na instituição e que a capacitação será feita de forma gradual por questão de logística. Além disso, só serão armados os guardas que estiverem aptos física e psicologicamente. 

Confira abaixo a nota da prefeitura:

"A Prefeitura de São Gonçalo informa que a Guarda Municipal está passando por modernização, para melhorar os serviços prestados pela corporação. Parte dessas ações é a capacitação inicial de 50 guardas municipais que receberão instruções para o uso do armamento, através de profissionais qualificados.

O processo de compra de munições que serão utilizadas para treinamento dos agentes foi divulgado através do Diário Oficial do município.

Os agentes selecionados receberão as instruções necessárias para execução das atividades armadas na instituição.

Por questão de logística e necessidade de manutenção do serviço, a capacitação dos guardas municipais será realizada de forma gradual. Vale ressaltar que somente executarão o serviço armado quem estiver apto física e psicologicamente para o trabalho, por meio de avaliação minuciosa por profissionais capacitados.

Pela Lei 13.675/2018, a Guarda Municipal faz parte do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), sendo a segurança pública um dever do Estado e responsabilidade de todas as esferas, sejam estaduais, federais ou municipais. Mediante capacitação prévia e continuada, a concessão do porte de arma de fogo em serviço pelos guardas municipais trará maior segurança e proteção para os munícipes e para o próprio guarda municipal."

Como é a situação dos guardas em outras cidades

Na cidade de Niterói, foi realizada uma consulta pública em 2017 que contou com a participação de 18.991 eleitores. Na ocasião, 70,97% (13.478) dos votantes decidiram não autorizar o uso de armas de fogo pela Guarda Municipal. Foram 5.480 votos pelo sim (28.85%) e houve 33 brancos e nulos (0.17%).

De acordo com a Prefeitura de Niterói, a guarda municipal da cidade " trabalha no seu dia a dia com espargidores de pimenta, com alcance médio de 2 metros e de 5 metros, todos não inflamáveis. Além disso, os agentes utilizam armas, conhecidas como sparks, que são dispositivos elétricos incapacitantes que emitem pulsos elétricos que atuam sobre o sistema neuromuscular, causando desorientação, fortes contrações musculares e queda do indivíduo, permitindo a incapacitação temporária do agressor. Os guardas que utilizam o equipamento recebem treinamento específico e também só são utilizados em caso de extrema necessidade, como forma de contenção, e com o objetivo de resguardar a integridade dos guardas, de terceiros e até mesmo do agressor."

Ainda de acordo com a Prefeitura de Niterói, todos os agentes da guarda municipal passaram por cursos de capacitação para a utilização dos materiais não letais, que são usados apenas em situações excepcionais, quando outras formas de atuação, como negociação e imobilização, tiverem se esgotado.

"A Guarda de Niterói passou, nos últimos seis anos, por um processo de aprimoramento com cursos constantes de reciclagem e treinamento específicos, incluindo a utilização de armas não letais. A aquisição pelo governo desse tipo de equipamento faz parte da reestruturação da corporação no combate aos pequenos delitos e prevenção à violência e em apoio a ações de ordenamento urbano.

O emprego de tecnologias de armamentos não letais é recomendado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública, pelo Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania e pela Organização das Nações Unidas", escreveu.

A Prefeitura de Maricá informou que " não possui armamento letal e não há projeto ou consulta pública em andamento sobre o tema. Um estudo técnico está sendo feito visando futura aquisição de armamento não-letal para os 379 agentes que compõem o efetivo da Guarda Municipal de Maricá."

A Prefeitura de Itaboraí não se manifestou.

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