Velório de aposentado morto no Salgueiro é marcado por pedidos de justiça
Clima no Cemitério São Miguel era de revolta e indignação

Cerca de 80 pessoas, entre familiares, amigos e vizinhos, compareceram ao Cemitério São Miguel, em São Gonçalo, no início da tarde desta sexta-feira (1º) para se despedirem do aposentado Valteres Pereira de Oliveira, de 57 anos, que morreu após ser atingido por um tiro na calçada de casa durante uma operação policial na localidade onde vive, no Recanto das Acácias, no Complexo do Salgueiro.
No local, o sentimento era de tristeza, mas também de indignação com a morte repentina do pescador e costureiro que era uma referência para a comunidade e querido por amigos e pela vizinhança. No cemitério, todos gritavam por justiça e chamaram os policiais que participaram da ação de covardes e corruptos. Devastada, uma das filhas, Tatiele Oliveira, precisou ser amparada pela família durante o sepultamento.
"Morrer é natural, faz parte da vida, mas foi covardia o que fizeram, eles atiram e não querem saber quem é, quem não é", disse uma das vizinhas que acompanhava o cortejo.
"A gente fica indignado com uma coisa dessas porque morador não é bandido, ele era um cara muito trabalhador, aposentado, que mesmo aposentado trabalhava com a costura dele, ele ajudava todo mundo da comunidade. Era uma pessoa maravilhosa, ninguém tem nada que falar dele. Uma pessoa muito boa, que é o que você vê aí, um monte de gente veio de longe pra ver ele.", disse a costureira Daiane Lemos, que mora perto da família e que também testemunhou toda a situação envolvendo a morte do pescador.

"Aconteceu por volta das 19h, eu escutei bastante tiro, aí eu saí e vi a Rosana chamando socorro e gritando meu nome. Quando eu saí até pensei que era meu esposo que tinha saído pra comprar cigarro, mas não era, era o esposo dela. Aí, o policial passou por cima da calçada, olhou e depois disse lá na frente para o outro policial que fez m*** e começou a dar tiro de novo. Mas não teve confronto nenhum porque a boca nem ali tava, a boca tava bem distante, eles já vieram dando tiro", completou a costureira, que ainda informou que os policiais alteraram a cena do crime.
"Depois que eles deram os tiros, nós entramos correndo pra dentro de casa, quando saímos de novo, ele começou a recolher as cápsulas de bala todinhas e levaram.", disse.
"Esse tiro eles confundiram como? Eles confundem tudo, né? E a gente finge que aceita, passa a vida inteira fingindo que aceita essa injustiça, essa covardia, tirar a vida de um ser humano cheio de luz, como esse senhor. Será que eles não têm pai, não tem mãe, não se respeitam? Não devem respeitar, porque não respeitaram a vida de um senhor sentado na calçada.", disse uma vizinha indignada.
Valteres deixa a esposa, três filhos e cinco netos, além de mais um previsto para nascer no próximo mês.
Na ação, a esposa Rosane Rosa Maia de Oliveira, de 54 anos, e a sobrinha, de 17, também foram baleadas. As duas foram levadas para o Pronto Socorro de São Gonçalo. A sobrinha, que foi baleada na perna, recebeu alta no mesmo dia e compareceu ao velório de Valteres nesta sexta-feira apoiada em muletas. Rosane, que foi baleada no braço esquerdo, corre o risco de perder os movimentos da mão, de acordo com a filha Tatiele.
Recordando o caso
Valteres, a esposa e a sobrinha foram atingidos na noite da última quarta-feira (30) durante uma operação policial no Recanto das Acácias, no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo. De acordo com a polícia, os agentes foram acionados para retiraram barricadas que foram colocadas por criminosos às margens da BR-101, próximas ao posto da Polícia Rodoviária Federal.
A polícia afirma que, chegando no local, os policias foram alvejados por tiros. Eles revidaram, o que deu início a um intenso tiroteio na localidade. Ainda de acordo com a polícia, cinco pessoas foram baleadas. Duas delas seriam criminosos, que morreram no Hospital Estadual Alberto Torres (Heat). Os outros três são Valteres e os familiares.
A versão da polícia é diferente da contada pelas filhas e vizinhos que estavam no local no momento em que Valteres, a esposa e a sobrinha foram atingidos. Segundo elas, não havia operação no local e o pai, que estava sentado na calçada com a família por conta do calor, foi atingido pelos agentes.
Ainda na noite da quarta-feira (30), os familiares, parentes e vizinhos de Valteres fizeram um protesto na BR-101, ateando fogo em pneus e entulhos. De acordo com Tatiene, o motivo era que a polícia queria remover o corpo do aposentado ao IML apenas na manhã seguinte.
O caso será investigado pela 73ª DP (Neves). As armas dos policiais militares que participaram da ação foram recolhidas para investigação.