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Beleza, limpeza, educação: legado olímpico?

relogio min de leitura | Escrito por Redação | 25 de setembro de 2016 - 12:00
Podemos dizer, numa visão ampla, que a educação constitui-se numa prática social que se realiza em diferentes espaços e diferentes momentos da vida em sociedade. Neste caso, a educação escolar, objeto de políticas públicas, cumpre destacado papel no processo formativo do indivíduo, ligado às práticas com as quais ele vai atuar no meio social em que vive. Assim sendo, impetra-se praticamente à escola, a responsabilidade de fazer com que as pessoas adquiram um pensar com mais propriedade e profundidade, de ter o cuidado consigo mesmas, enfim, cabe à escola promover, no indivíduo, a aquisição de uma visão mais ampla do mundo que o cerca. Eu concordo com esta premissa. Mas há um ponto que eu gostaria de discutir aqui. Que atitude a maioria das pessoas tem diante de um ambiente limpo e lindo?
Meu pensamento em relação a esta questão me leva aos ensinamentos dos monges que consideram a limpeza um aprimoramento espiritual. Há um livro muito interessante do monge Keisuke que discorre sobre o assunto de uma forma bem agradável. É o Manual de limpeza de um monge budista, lançado pela Editora Planeta e que se tornou um best-seller na Espanha, na Itália e no Japão.
O propósito do monge, através de reflexões filosóficas de fácil acesso, é inspirar e estimular o leitor a cuidar melhor do lugar em que mora. Matsumo Keisuke aponta, em seu livro, para a sensação de prazer que se sente na organização do próprio quarto, na reciclagem do lixo ou na limpeza do banheiro. Assim, longe de ser um fardo, varrer a poeira do chão significa retirar a sujeira da alma. É limpar os olhos da impureza do mundo, é clarear a visão para o belo e limpo, enchendo-se da sensação interna de harmonia e serenidade. 
Por que eu estou falando de beleza, limpeza e educação? Durante as Olimpíadas não fui ao Boulevard e nem ao Parque. Todos me diziam que tudo estava muito lindo, cheio de gente. Eram estrangeiros e brasileiros misturando seus idiomas na alegria do evento e tudo muito limpo. No sábado passado, atravessei a Baía e me dirigi à Praça Mauá para viver de perto o Rio Novo. Dali, passeei pelo Boulevard e fiquei apreciando a arte indígena espalhada ao longo da calçada e a arte do mural Etnias, do artista Eduardo Kobra estendida ao longo dos paredões da Orla Conde, que recebeu o certificado do Livro dos Recordes – o Guiness, como o maior grafite do mundo. ‘Coisas belas! Agradáveis de se ver! As vozes que eu ouvia não vinham de outros países. Eram vozes que falavam a minha língua. Era o meu povo mesmo que passeava por aquele lugar acolhedor, artístico, asseado. 
Barracas de comida bem arrumadas se estendiam pelo canto das calçadas e banquinhos de plástico eram oferecidos pelos vendedores àqueles que escolhiam sua tenda. Comi vatapá. Andei por quase todo o Boulevard, pela Praça Mauá, pela Praça 15 e não vi um papel sequer jogado no chão. Só vi beleza, limpeza e educação. Se manter uma casa limpa e arrumada, como prega o monge budista, é o mesmo que manter a alma limpa e organizada, o que dizer sobre manter limpa a nossa cidade, reflexo do nosso lar? E sobre manter limpas e bonitas as nossas escolas públicas, para que os alunos vivam a experiência da beleza e da limpeza da alma? Ali, naquele pedaço do Rio Novo, eu vi gente de todos os níveis, de todo jeito, respeitando e sentindo-se bem no meio do belo e do limpo. E o Parque Olímpico? Admirável, recebendo milhares de pessoas que mantinham as mesmas atitudes básicas de educação. 
Sempre tive a convicção de que quando se oferece o belo, o bom e o bonito às pessoas, elas aprendem a gostar do que vivem e se sentem como os monges: limpando o espírito, clareando a alma, respeitando a vida. É disso que uma cidade, como um todo, precisa: doar à sua população beleza, harmonia, serenidade e paz. Isto é educação. E é preciso estender o novo por todos os recantos deste Rio, e de todas as cidades cujos governantes, ao se candidatarem, prometem, enquanto não eleitos, cuidar dos que chamam de “seu povo”. O difícil, agora, é o governo manter estes lugares da forma como foram concebidos. É muito ruim ter essa sensação de desamparo e descrença frente à fala dos que pretendem ser eleitos. São vozes vazias, repetitivas, reverberando o nada. Mas seria bom se algum deles que fosse eleito insistisse na concepção de educação do povo baseada na limpeza e na beleza. Aliás nosso velho amigo Aristóteles já dizia: O belo é o esplendor da ordem.

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