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Justiceiros: mais um rapaz é linchado em São Gonçalo

Parte do espancamento foi filmado e está circulando nas redes sociais

relogio min de leitura | Escrito por Redação | 16 de setembro de 2017 - 07:45
Ontem, na Rua Maria Silva Dias André, moradores e comerciantes não quiseram comentar o caso
Ontem, na Rua Maria Silva Dias André, moradores e comerciantes não quiseram comentar o caso -

Por Leticia Lopes e Thuany Dossares

Acusado por populares de estar cometendo roubos no Pacheco, em São Gonçalo, um rapaz, de 22 anos, foi linchado, no final da manhã de quinta-feira, na Rua Maria Silva Dias André. No entanto, nenhuma vítima apareceu para reconhecê-lo e, de acordo com a polícia, o jovem não possui antecedentes criminais.

Parte do espancamento foi filmado num vídeo que dura cerca de quatro minutos e está circulando nas redes sociais. Nas imagens, é possível ver diversos homens dando socos, chutes, chineladas e, até mesmo, agredindo a vítima com telhas. O crime foi registrado por um homem que parece incentivar os agressores, além de ter sido assistido por diversas pessoas.

Com um corte na cabeça e o corpo com manchas de sangue, a vítima pede para seus algozes pararem. “Desculpas, me perdoa, por favor. Eu nunca fiz isso, eu fiquei desesperado”, falava. Enquanto uma pessoa pede para que as agressões fossem interrompidas, um homem chegou a tentar tirar o rapaz do local, mas foi contido.

Segundo testemunhas, os agressores chegaram a jogar gasolina no corpo do rapaz e ameaçado incendiá-lo, mas o jovem foi salvo por uma equipe dos Bombeiros que o socorreu para o Hospital Estadual Alberto Torres (Heat), no Colubandê, onde foi medicado e recebeu alta no final da tarde. Policiais do 7ºBPM (São Gonçalo) foram acionados e ao chegarem não encontraram nenhuma pessoa que tenha sido roubada pelo rapaz.

Na manhã de ontem, uma equipe do OSG foi até o Pacheco para procurar possíveis vítimas, mas moradores e comerciantes do bairro alegavam apenas que sabiam do caso e que ouviram falar que o rapaz estaria roubando na região, mas ninguém tinha o visto antes.

Vários casos na cidade nos últimos três anos

A agressão foi registrada na central de flagrantes da 74ªDP (Alcântara) e até o início da tarde de ontem, nenhuma pessoa havia comparecido à delegacia para reconhecer o rapaz como autor de algum assalto. O caso será encaminhado para a 75ªDP (Rio do Ouro), que irá investigar o crime e analisar o vídeo para tentar identificar os agressores.

Recordando - Esse caso não é o primeiro em São Gonçalo. Em junho do ano passado, Francisco Sérgio Mendes Rocha, de 34 anos, foi morto por um grupo de 10 pessoas no Barro Vermelho, a pauladas e pedras, além de golpes de tijolos e paralelepípedos. Kôka, como era conhecido pelos amigos, foi perseguido por aproximadamente 1 km pelo agressores, que o acusavam de praticar pequenos furtos no bairro. Na época, O SÃO GONÇALO contou sua história (http://www.osaogoncalo.com.br/policia/15924/uma-historia-sob-pedras ).

Também em 2016, um homem que não teve o nome divulgado pela polícia foi espancado e arrastado pelas calçadas da Rua Marcos Costa, no Jardim Catarina. Segundo testemunhas, ele tentou fugir dos algozes, que o alcançaram e o espancaram até a morte. Também no Jardim Catarina, em fevereiro de 2014, Magno Nogueira da Conceição teve mãos e pés amarrados por cordas, e foi obrigado a desfilar por diversas ruas do bairro.

Brasil é campeão mundial de casos de linchamentos

De acordo com uma pesquisa do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP), que estudou casos de linchamento no Brasil de 1980 a 2006, o Brasil é o país que mais pratica esse tipo de crime no mundo, registrando 2.579 casos durante o período analisado. Desses, somente 1.150 sobreviveram ao espancamento. O Rio aparece em segundo lugar no ranking nacional, com 204 ações de justiceiros.

O campeão é São Paulo, com 568 casos. O levantamento feito pelo sociólogo José de Souza Martins, professor da USP, virou livro ‘Linchamentos - A Justiça Popular no Brasil’, publicado em 2015. Para Martins, são vários os fatores que fomentam os linchamentos. “No geral, a indignação súbita por ato violento que alcance pessoa frágil, inocente ou indefesa é um dos motivos. Mas a predisposição para linchar vem de uma consciência social e do senso comum de que as instituições não funcionam, a polícia demora e a Justiça é lenta e complacente”, explica o sociólogo no livro.

Para especialista, descrença nas instituições e motivação

Para Klarissa Platero, professora do Departamento de Segurança Pública da UFF, a descrença nas instituições, principalmente em órgãos da Justiça, e a certeza de impunidade são as duas grandes questões de casos de linchamentos.

“O que tem que ser feito é identificar as pessoas que participam dessas ações. Porque é pela ideia de anonimato por se tratar de ações em grupo que esses casos acontecem. Aí as pessoas vão perceber que não, que existe sim uma reposta da Justiça”.

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