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Mais de 6 mil rodoviários são afastados em função da violência urbana e estresse no trânsito

relogio min de leitura | Escrito por Redação | 24 de março de 2017 - 18:54
Pesquisa nacional confirma relatos dos rodoviários de SG a Região dos Lagos
Pesquisa nacional confirma relatos dos rodoviários de SG a Região dos Lagos -

Três dias após um ônibus ser sequestrado na Avenida do Contorno, em Niterói, quando um homem manteve, por 45 minutos, 25 pessoas reféns, e logo depois um outro coletivo ser assaltado na mesma região, dados do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de Passageiros de Niterói a Arraial do Cabo (Sintronac) são preocupantes: 6,6 mil rodoviários estão afastados por problemas psiquiátricos, psicológicos e neurológicos em função da violência urbana e do estresse no trânsito. 

O número, que corresponde a 25% do efetivo, tem 80% dos casos concentrados em Niterói e São Gonçalo. De outubro de 2015 a outubro de 2016, 2.252 motoristas e cobradores se consultaram com psiquiatras da entidade, 6.998 com psicólogos e 4.513 com neurologistas.

Afastado de suas funções há dois anos, um motorista de Niterói que preferiu não se identificar, conta sobre o desgaste da profissão. Na condução dos coletivos por 18 anos, o homem de 57 anos faz tratamento atualmente com psicólogos para tentar superar a síndrome do pânico e não consegue dirigir nem o próprio carro.

"Não tenho mais nenhuma condição de trabalhar. Tenho crises até ao andar de ônibus", disse.

Morador do bairro Pendotiba, em Niterói,  ele passou pelas funções de cobrador e manobrista antes de assumir os volantes, e se diz saudoso da rotina. "No começo, tinha até festa de aniversário nos ônibus. Hoje é tapa na cara", lamentou. 

Na delegacia, o motorista do ônibus que faz a linha 409 (Alcântara-Niterói), sequestrado no acesso à Ponte Rio-Niterói, Ailton Tavares de Oliveira, 43, foi apontado pelos passageiros como um herói, mas, humildemente, não se vê nessa posição.

"Não sou herói, sou apenas um bom profissional. Assim que ele anunciou o assalto, eu já imaginei que a PRF fosse estar na altura do estaleiro, então não entrei em pânico. Fiquei com medo quando ele falou que iria matar a refém, ele a tirou da cadeira e fez de escudo humano. Tive medo de acontecer o pior, passou pela minha cabeça até o caso do sequestro do ônibus 174", declarou Ailton. 

Segundo Juréa da Conceição, psicóloga do Sintronac há seis anos, os principais transtornos enfrentados por motoristas e cobradores são ansiedade, depressão e até síndrome do pânico, causados não somente pela violência, mas também pela alta competitividade no trânsito e as pressões para o cumprimento dos horários. Juréa ainda pontua que a dupla função também é um agente de peso. 

"Essa mudança na rotina, quando o motorista passou a ser também cobrador, contribuiu e muito para os problemas emocionais que eles enfrentam", disse. 

Pesquisa confirma desgaste na profissão 

No mesmo dia dos dois casos envolvendo coletivos em Niterói, a Confederação Nacional do Transporte (CNT) divulgou a primeira pesquisa da instituição que traça um perfil dos motoristas de ônibus urbanos. Cerca de 57% dos entrevistados destacaram que a profissão é desgastante, estressante ou fisicamente cansativa. Outros 35,9% consideram uma profissão perigosa e 19,8%, arriscada, devido à possibilidade de acidentes.

Em relação à segurança, quase um terço (28,7%) diz ter sido vítima de assalto pelo menos uma vez nos últimos dois anos e 3,1% informaram que neste mesmo período o ônibus em que trabalhavam sofreu incêndio proposital ou alguma tentativa. Um terço (33,2%) se envolveu em pelo menos um acidente nos últimos dois anos.

Marcos José , de 44 anos, trabalha há 15 como motorista. Fazendo atualmente o itinerário Alcântara-Campo Grande e trabalhando até 12 horas por dia, ele conta que os assaltos são recorrentes, e que o segredo é sempre manter a calma.

"Tem gente que não aguenta. Tive um amigo que foi assaltado duas vezes e teve que pedir férias", contou.

Motorista há sete anos, Henrique dos Santos, 30, que também faz o trajeto para o bairro da Zona Oeste do Rio, diz gostar do trabalho, mesmo com as dificuldades.

"Nós estamos sujeitos a qualquer coisa, basta colocar o pé para fora de casa", disse que, além da violência, Henrique também pontua os diversos problemas no trânsito.

Um quarto dos entrevistados (24,5%) disseram estar há mais de 10 anos na mesma empresa e 75,5% estão satisfeitos e não têm vontade de trocar de emprego. Ao falarem por que atuam na atividade, 70% afirmam que gostam de dirigir ônibus urbanos e 33% dizem que essa profissão oferece um salário melhor do que outras.
Com questões sobre rotina de trabalho, tecnologia, segurança e saúde, entre outros, 1.055 motoristas foram entrevistados em dezembro de 2016, em 12 estados. 

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